sexta-feira, 15 de junho de 2007

IX - DE LISBOA A TAVIRA COM O ALENTEJO LOGO ALI

O avo José Francisco Massapina, filho mais velho de Maria Albertina de Sousa Freire Massapina, Enfermeira e de José Augusto Massapina também Enfermeiro, nasceu em Moura no Alentejo na Freguesia de São João Baptista, casou com a sua prima Clara da Conceição Massapina, nascida em Beja na Freguesia de São Salvador filha de Francisco Manuel Caeiro Massapina, Professor e de Maria do Carmo Vargas.
O avo Massapina foi ao longo da sua vida funcionário publico, esteve na Companhia Inglesa dos Telefones, e ainda se destacou como politico Republicano, amigo dos primeiros Presidentes da Republica, andou fugido disfarçado de pescador e pastor, e escondeu na sua casa granadas e aramas que foram utilizadas na revolução de 1910, situação que a familia ignorava e só veio a ter conhecimento após a revolução, foi depois da implantação da republica muito perseguido devido ás suas ideias muito próprias sobre as necessidades do país e do povo. Mais tarde exerceu funções no Ministério da Agricultura como capataz agricola, esteve a exercer funções nos Postos Agrários de Evora, Silves, Castro Verde e Tavira onde fou promovido a Prático Agricola, vindo a falecer em Tavira onde se encontram os seus restos mortais. Conhecido e estimado por todos, a provincia do Algarve prestou-lhe várias homenagens pela sua competencia profissional e também pelas suas atitudes pessoais.
Viveu um periodo da sua vida dividido entre Lisboa e Viana do Alentejo, Castro Verde e Cuba, e outros locais do Alentejo.
Nesses diversos locais do Alentejo, tenho hoje espalhados vários primos, frutos de outros ramos da familia, nomeadamente ramos nascidos dos meus bizavós, e de irmãos seus. Por exemplo o meu primo Comerciante o Nelson Bexiga Massapina de Cuba e a restante familia. É também de Moura, que nasce a familia dos meus primos Arquitectos o Vasco Massapina e o João Massapina, bem como muitos outros primos ligados a um ramo da familia que dirigiu durante muitos anos as Águas Pizões Moura, e que por esse facto ali se fixaram. Está também ligada a estes ramos da familia, por via de casamento a minha prima escritora, a Isabel Lhansol Massapina.

Foi por ali, pelos locais mais variados do Alentejo, onde os pais do meu avo, e consequentemente meus bizavós, desenvolveram a sua vida profissional e comercial, e onde ele acabou por também ir parar, anos mais tarde, por razões também comerciais e profissionais.
Fez a sua formação escolar entre Lisboa e o Alentejo, e frequentou o seu curso em Santarém e Évora e acabou por concluir o seu curso de Regente Técnico Agricola, na cidade de Évora, tanto quanto me foi dado perceber, graças a umas importantes notas agora recuperadas e escritas pelo punho da minha mãe já acamada no Hospital antes de falecer.
Depois de alguns negocios no ramo automovel, em LIsboa e no Alentejo, foi parar à cidade de Tavira, para exercer a sua profissão de sonho, a agricultura, no Posto Agrário de Tavira, situado junto da estação ferroviaria, onde acabou por chefiar os serviços durante vários anos.

Curiosamente o seu filho e meu tio, José Massapina Junior, acabou também por tirar o curso de Engenheiro Técnico Agricola, e veio a chefiar também esse mesmo porto agrario, durante largos anos, apenas interrompidos por alguns tempos no Ministério da Agricultura em Lisboa.

A cidade de Tavira, tornou-se mais um dos berços de acolhimento da familia Massapina, berço que ainda acolhe os meus primos, Zeca e Gabriela e os seus filhos. É uma localidade bastante antiga, e foi povoada por Romanos, Fenicios, Gregos e obviamente pelos Mouros.
Contou com a presença Islamica, a presença mais longa, que durou mais de 5 seculos, entre os Sec. VIII e XIII, e foi conquistada aos Mouros, em Junho de 1239 por Dom Paio Peres Coimbra.

Tavira sempre foi uma cidade com uma mentalidade potencialmente anti-clerical, e uma das provas disso é o facto de terem sido banidos os padres em 30 de Maio de 1834, pelo Ministro Joaquim António de Aguiar, dentro da revolução liberal.

É também uma cidade que ao longo da sua história tem sido pouco bafejada com a sorte, pois tem sofrido grandes cheias que a devastaram por várias vezes, para além de já ter sido atingida por mais de uma vez por terramotos que a arrazaram, e como se isso não basta-se, temos ainda que referir os efeitos da peste que a devastou de 1645 a 1646.

O meu avo, homem de fortes convicções pessoais e politicas nunca virou a cara á luta, e foi um Republicano dos sete costados. Casou várias vezes, tenho conhecimento de pelo menos 3, e sempre repetia o casamento por via de inviuvar, e teve uma boa remessa de filhos desses casamentos. Entre eles nasceu a minha mãe, Libania da Conceição Massapina, filha da bonita avó Clara, que eu não tive o prazer de conhecer pessoalmente, pois veio a falecer muito nova, deixando a minha mãe, com 12 anos de idade, como tutora dos irmãos mais novos.
Viveu muitos anos numa casa muito bonita, situada mesmo junto do rio, onde mais tarde nasceu uma agência bancaria que à poucos anos ainda lá se encontrava, ali bem junto da velha ponte romana, tão bonita como a imagem do Rio Gilão e das suas águas reflectidas durante a noite com a as luzes, por vezes mais parecendo um canal de Veneza.
Essa ponte tem uma importancia muito grande para toda a familia, pois era por ela que se fazia a ligação para a outra margem de Tavira, e foi em cima dela que ocorreu um dos episodios mais engraçados da vida do meu avo com o meu tio Zeca.
Um dia o meu tio Zeca decidiu começar a fumar, e então com os colegas de escola comprava os cigarros à unidade para serem mais baratos do que ao maço.
O meu avo que era um fumador incorrigivel tentava que os filhos se afastassem desse vicio, e ao desconfiar que o Zeca já fumava, montou uma armadilha para o apanhar, e tentar afastar do vicio.
Assim esperou um dia em casa que o Zeca regressa-se do Liceu, e quando o viu ao longe com um cigarro na mão, colocou-se a caminho na rota de encontro. Encontraram-se no meio da ponte, e o meu tio como queria esconder que já fumava, meteu o cigarro no bolso ainda a arder. O avo Massapina fez questão de ficar ali um bom bocado a falar com ele, de tal forma que o cigarro continuou a arder dentro do bolso, queimou-lhe a mão e as próprias calças, de onde começou a sair fumo.
Quando já estava satisfeito com o castigo, o avo disse-lhe, já podes ir para casa mudar de calças, que essas estão queimadas, e podes começar a fumar á minha frente, mas por favor tenta combater esse malvado vicio, pois só alguem muito viciado, ou com muito medo de mim podia aguentar essa mão com esse cigarro a arder tanto tempo dentro desse bolso.
O tio Zeca contava que continuou a fumar, mas tinha durante muitos anos vergonha de o fazer na frente do avo. Assim nasceu mais um fumador incorrigivel, o tio Zeca, que eu recordo a fumar até ao ultimo dia que com ele contactei.

Quando se reformou, o meu avo, continuou a viver com o meu tio Zeca, e com a tia Gabriela, agora numa casa mais moderna na chamada zona nova de Tavira, perto do novo tribunal. Os meus tios foram os seus fieis amparos até ao seu ultimo dia, e podia ser encontrado diariamente a passear pelo jardim de Tavira, junto do velho mercado, hoje um espaço cultural bastante aprazivel, ali junto ao rio, sempre impecávelmente vestido, com o seu inseparável chapeu na cabeça, artefacto que nunca abandonava, e que era como que um complemento de si próprio.
Recordo os passeios dados em Tavira pela sua mão. O seu aspecto impecável, sempre com um sorriso sereno no rosto firme e bonito, a forma como todo o mundo o conhecia e tratava, simplesmente por Senhor Massapina, e o saudava, e o seu bom dia cordial e sorridente para todo o mundo, a sua forma tão feliz e orgulhosa como me levava a passear, quando eu ia ao Algarve passar férias, nos poucos anos em que tive esse previlegio de o conhecer ainda vivo.
Hoje ele é um sonho importante para mim, um sonho que eu vivo de uma forma real, tal o grande carinho que eu por ele nutria.
Ele era o meu heroi de infância, e ainda hoje esta nas paginas douradas do meu album de memorias de homens a admirar, pelo seu caracter, pela sua forma impluta de estar na vida, e talvez também pelas historias que muito levemente me recontava, e pelos seus ensinamentos de vida pessoal, que sempre procurei seguir à risca.
Foi a minha primeira grande referência familiar e também a minha primeira grande perda em termos familiares. Só tive conhecimento do seu falecimento quando cheguei ao Algarve para umas férias, e não o encontrei, e senti aquela casa tão vazia.
Por outro lado a minha mãe sempre que se deslocava a Tavira, não dispensava uma ida imediata ao cemitério que fica na entrada da localidade, para visitar o gavetão onde estão os seus restos mortais.
Eu próprio após o falecimento da minha mãe já ali voltei sozinho, como que para lhe dizer que a sua filha também tinha partido, mas que ficara a descansar num outro gavetão, longe dali na distância, mas perto em termos de emoção intima, pois se existia pessoa de quem a minha mão gostava era do meu avo Massapina.

E foi ali, naquele primeiro dia de férias em Tavira, sem o avo Massapina, que eu me apercebi do quanto importante ele era para mim, e também de que o fim daqueles de quem muito gostamos, é sempre factor de muita saudade e recordação e que ficam indelevelmente marcados para todo o resto das nossas vidas.

Tal como viveu uma vida serena, também assim veio a falecer, durante o sono, e foi encontrado pela empregada de casa, na manhã, como se continua-se serenamente a dormir.
A empregada só se apercebeu da sua partida deste mundo, ao chamar e não ser correspondida, enquanto abria as cortinas do seu quarto para o acordar, como fazia todas as manhãs, para o ajudar a arranjar para ir tomar o pequeno almoço e dar o seu habitual passeio matinal.
A sua morte, ocorrida dessa forma serena, foi a verdadeira morte ideal, se é que existe uma morte ideal. A morte a que todos nós não escapamos um dia. Esta é a forma de morrer que eu um dia também gostaria de ter. A dormir serenamente.
Morrer a dormir, de uma forma serena, foi como que a imagem final da sua vida, uma vida de tranquilidade, de entendimento para com o próximo, uma vida que a morte nunca vai conseguir apagar das nossas memorias.

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