quinta-feira, 17 de abril de 2008

XXXII– A VIDA DA POLITICA

Viver não cansa o que cansa são as perguntas de quem não quer ou não sabe ter opinião própria. Os comentários de quem; não gosta de pensar, ou algumas perguntas de jornalistas que gostam de se fazer de espertos, quando muitos deles nem sabem escrever o seu próprio nome, isso sim cansa, e muito.
Viver realmente não cansa, o que cansa mesmo é ter que fazer muitas vezes de cego, diante dos colarinhos clericais que usam os dogmas para tentar ganhar de modo fantasioso, algumas almas e assim tentarem despovoar o inferno, e outros daqueles locais de que tanto gostam de falar.
Mas o que me cansa mesmo muito; é ter que gramar os que vivem das politicagens, e os cinismos dos oportunistas, ou ter que lidar diariamente com a chamada fofoca de quem não tem nenhum brio ou brilho próprio, e fala dos outros sem saber do que realmente esta a falar, pois muitas vezes nem sabe do, ou de quem se trata.
E o que me fatiga mesmo, e me deixa exausto; é ter que engolir em seco, ao ver certos empregos apadrinhados, ocupados por incompetentes que da vida apenas sabem que nasceram, mas nem sabem como tem conseguido sobreviver até ali, e isso “porra” cansa-me mesmo muito!
Me deixa deveras exausto!
Talvez por causa de muitas destas razões, e canseiras, eu um dia acabei por me cansar mesmo da política, e para não morrer cansado de tanta ‘malandragem’ e ‘hipocrisia’ resolvi cair fora desse estranho mundo, enquanto ainda era tempo de conseguir sobreviver sabendo os caminhos que trilho no dia a dia da minha vida.
Mas quando ainda vivia a política, e não da política como muitos outros ainda hoje o fazem, eu aproveitava mesmo para viver, e guardar memórias que o tempo não apaga.
Desde aquela Assembléia eleitoral da JSD do Barreiro, que passei a viver política por tudo quanto era poro do meu corpo, e por tudo quanto era tempo disponível e vida vivida. Mas mesmo assim, nunca fui egoísta, ainda consegui guardar um pouquinho do meu precioso tempo para conseguir ter alguns bons momentos de autentico companheirismo, intimidade e muitas vezes também cavalheirismo.
Ao contrario do que muitos podem imaginar o dia seguinte a uma vitória eleitoral é sempre o mais difícil de digerir, e se uma derrota pode colocar o visado numa situação de apatia e desalinho durante dias ou mesmo, algumas vezes, semanas, o dia seguinte de um vencedor é de todos os dias o mais difícil. É um dia difícil pela angustia, por não ter outro remédio que não seja assumir a vitória e encarar o desafio de ter de cumprir o programa apresentado, ou as promessas feitas durante a campanha, pois sabe que mais cedo ou mais tarde os eleitores lhe vão cobrar as letras gastas das promessas feitas.
A melhor regra para diminuir essa angustia, que nos vai acompanhando pelo tempo fora do mandato, é cumprir no mais breve espaço de tempo possível, para se conseguir libertar desse peso na consciência, e por outro lado iniciar imediatamente uma luta diária e constante na defesa e consolidação dos objetivos alcançados.
Os primeiros tempos são sempre os mais difíceis, seja por um lado pela novidade, seja também pelo simples fato de que é nesse primeiro período que os derrotados ficam bem mais atentos e, prontos a atacar-nos desde que surja qualquer dúvida ou mal entendido.
No caso concreto da JSD do Barreiro, tal não fugiu á regra, e nos primeiros tempos após a vitória, eu, e toda a minha equipa eleita, sentíamos o peso da constante observação sobre os nossos atos pessoais e decisões coletivas.
O desenvolvimento do trabalho foi-se processando na medida do possível, face ás grandes carências existentes, pela falta de recursos técnicos e financeiros, e que eram já do conhecimento geral.
Naquela época na minúscula sala da JSD, com menos de 9 m2, faziam-se autênticos milagres com os muito escassos meios existentes.
Os cartazes para as campanhas das Associações de Estudantes do Secundário eram normalmente ali trabalhados e pintados em horário que não pudesse prejudicar as atividades do Partido na sala comum, para poderem ali secar durante a noite e a manhã seguinte, período em que a sede normalmente se encontrava encerrada ou com muito pouco movimento.
Nesses gloriosos tempos os cartazes e tarjas eram desenhados e pintados á mão, pois material de propaganda já pronto, e trabalhado numa gráfica, era para nós um luxo que não estava ainda ao nosso alcance, pois a JSD do Barreiro era uma estrutura das mais autônomas e do Distrito que se possa imaginar.
Os próprios autocolantes de campanha para as diversas listas concorrentes eram ridiculamente preparados á mão em processo moroso, repetitivo e porque não dizer mesmo, vergonhoso, para a Juventude Política de um dos maiores Partidos Nacionais. Os programas de candidatura eram montados da forma mais artesanal que se possa imaginar, e posteriormente reproduzidos a preto e branco, tentando colocar o máximo de fotos possíveis e texto no mais reduzido espaço possível para poupar papel e claro o numero de fotocópias a reproduzir.
Tenho que reconhecer, que nos primeiros tempos, não fora a ajuda preciosa do Francisco Mendes Costa, e as dificuldades teriam sido muito maiores, na realidade ele nesse capitulo sabia ser um político com ‘P’ maiúsculo, pois acabadas as eleições entendeu que era com nós que teria de trabalhar. E nesse capitulo como em alguns outros colaborou de forma bastante positiva, esquecendo desde logo em termos práticos, a derrota da lista sua afeta, se bem que obviamente no seu intimo lá se mantivesse a magoa de uma derrota.
Eu achava toda aquela forma de trabalhar em cima do joelho perfeitamente ridícula, mas necessária. O que mais se poderia fazer com os meios disponíveis? Nada, mesmo mais nada, só arquitetar a resolução da questão para o futuro. Mas naquela época a verdade é que não existiam mesmo os meios financeiros e técnicos para se conseguir fazer mais e melhor, nem disponibilidade aparente dos diversos órgãos e responsáveis de nível superior.
A descoberta da existência de uma; maquina repetidora no sótão da sede, foi uma esperança temporária, para se poder assim reproduzir em quantidade programas eleitorais, pois quando contabilizados os custos da sua reparação, e o orçamento para funcionar normalmente, chegou-se á brilhante conclusão de que ficaria ainda mais caro do que se a JSD continua-se a utilizar os precários meios existentes no momento.
O partido não oferecia á JSD nada que lhe fosse útil ou proveitoso, só presentes envenenados, como aquela repetidora desatualizada, velha e podre.
Não demorou assim muito tempo até que eu entendesse que a JSD se tinha que virar pelos seus próprios meios, e a encontrar fontes de financiamento, de que recordo ainda a realização de sorteios, festas e excursões entre outras formas de financiamento relativamente rápido e sem riscos.
O Partido começou a sentir-se incomodado, pois um dos modos que tinham imaginado para torpedear a nossa atividade era precisamente o estrangulamento financeiro.
A tesoureira da Comissão Política, a Fernanda Rodrigues, geria os parcos recursos financeiros com verdadeira mão de ferro, e nós dessa forma conseguíamos ir levando a atividade a cabo com maior ou menor dificuldade.
Por outro lado nessa mesma época a minha vida pessoal era também uma roda viva. Eu nessa época namorava; com a Maria do Céu, mas a relação era já mais por obrigação do que por devoção, e dessa forma eu como que tinha uma namorada?! Uma, por dia, e sempre rodando para não me cansar ou enjoar.
Já mesmo nas semanas que antecederam as eleições para a Comissão Política Concelhia da JSD, não foram só de preparação do ano eleitoral, eu não perdia uma oportunidade de poder conviver com alguma garota mais interessante.
Reconheço que só voltei a ter algum juízo, nesse aspecto, após conhecer a Fernanda e iniciar o namoro com ela.
No mesmo dia eu conseguia sair com 2 ou 3 garotas e chegar mesmo a vias de fato com ambas, era uma loucura total nesse aspecto essa época da minha vida.
Naquela época uma das miúdas de topo do Partido e da JSD era a Vera, filha do Dr. Fernando Silva, que era na época Presidente da Comissão Política do Partido. Era uma garota verdadeiramente deslumbrante, era mesmo modelo profissional e como tal capaz de fazer parar o transito com a sua beleza e compleição física. Era naquela época o sonho de qualquer jovem da JSD e não só, e eu sem saber muito bem como tudo começou, numa festa, acabei por ficar a curtir com ela. Nesse aspecto especifico também não era nada de se jogar fora, no entanto, tanto eu como ela sonhávamos com mais alguma coisa.
Acabou por aparecer na redação do jornal um dia, ao fim da tarde, e não se fez de forma alguma rogada, mostrando desde logo para o que vinha.
Acabou por ser para mim uma grande desilusão, ao aproveitar o famoso sofá desdobrável existente nas instalações da Redação da Voz do Barreiro, pude ter a visão de um corpo realmente escultural, mas só a visão, pois, que; quando fui tocar no seu corpo, este mais parecia construído em material emborrachado, uma garota daquelas de borracha para encher com um sopro...
Tudo estava bem emborrachado e como diria um mecânico com muitas folgas, a única peça do seu escultural corpo que se mantinha sem grandes folgas era a sua magnífica vagina, muito embora ela já não fosse de todo virgem.
Depois veio a grande surpresa, pois para quem imaginava uma jovem pura e casta, acabou por encontrar uma autentica depravada no sexo oral, era mesmo a sua grande paixão e loucura e não fazia nada por menos, adorava chupar todo o liquido como se fosse chantili de um gelado.
Embora eu não tivesse como ponto assente, querer algum dia casar com uma mulher virgem, tal como imaginavam os machos latinos da época, e muito embora isso tenha vindo a acabar por acontecer, também não estava muito disponível, naquele momento da minha vida, e com a minha idade, para me dedicar a colecionar loiras platinadas. Loiras com o corpo tratado na base de tratamento hormonal e com um curso superior, bacharelato e doutoramento em sexo oral.
Nessa mesma época uma jovem amiga da Vera, mostrava grande interesse em me conhecer pessoalmente, e acabou por me ser apresentada precisamente pela Vera.
Até hoje, não sei se por influencia pessoal da amiga, ou mesmo por sua opção pessoal. O que sei é que não largava os locais que eu freqüentava e começou a aparecer inclusivamente na redação do jornal com as desculpas mais esfarrapadas, como ver fotos de arquivo, pensava que a amiga estava por lá, enfim um sem numero de argumentos sem muito nexo.
Sei que a Isabel tinha pouco mais de 18 anos, e descobri também depois que tinha uma vontade indomável de fazer sexo, e o mais interessante é que ela embora ainda fosse virgem, adorava sexo anal, e ser de preferência penetrada em pé.
Acabou por me confidenciar que desde os 14 anos tinha vida sexual ativa, embora até aquele momento fosse virgem, e a razão dessa situação era só uma; o grande segredo da sua vida. Quem a iniciara na vida sexual fora o seu próprio irmão, mais velho 3 anos, e como tal tinha medo de ficar grávida dele, mesmo com preservativo, tinha imenso receio. Eu fiquei extasiado com aquela história, como era possível uma situação daquelas, com o próprio irmão, e ainda por cima ela afirmava que mantinham um relacionamento intimo muito freqüente, umas duas ou três vezes por mês.
Quase que não dava para acreditar, acontecia cada situação na minha vida intima e pessoal, e ainda para agravar mais a situação, acabei por ter que lavar eu próprio o sofá da redação com uma escova, água e sabonete liquido de mãos, pois um belo dia aconteceu o inevitável e ela passou por decisão própria á categoria de plena mulher.
Das poucas vezes na minha vida em que tive receio de ter engravidado alguém, sem querer, foi nessa época e com essa jovem, acho mesmo que ela estava a fim de ficar grávida, pois não tomou nenhuma providencia e fez mesmo questão de se tornar mulher comigo sem tomar nenhuma cautela.
Eu, no entanto, por um lado era mesmo inconsciente e por outro devia ter algum mel, nessa época da minha vida, pois que acabei por ser apresentado; pessoalmente, a uma betinha do Barreirense, sua amiga, que me telefonava todos os dias para marcar encontros. Ao principio até pensei que fosse combinado para me testar, depois confirmei que não, e assim um dia lá nos encontramos na Avenida da Praia.
Não perdeu muito tempo e a sua conversa foi curta e direta, acabei por ter relações com ela na muralha, perto de onde existia um Guincho/grua instalado num passadiço, logo ao lado do Clube de Vela do Barreiro.
Agora a ironia era que não sei se era moda da época, mas adorava ser penetrada analmente e de pé. Devia ter uma grande coleção de calcinhas, pois todas as vezes que nos encontramos aproveitava-as para se limpar, e para limpar o meu pênis e depois; atirava-as ao rio, não sei se para ter sorte, ou para evitar alguma contrariedade em casa.
Acabou por casar com um jogador de basquete do Barreirense, e sempre que me encontrava, brincava dizendo que continuava a comprar calcinhas e como tinha a gaveta cheia, gostaria de escolher algumas para mandar fora e, portanto; era importante combinar alguma coisa. Posso assegurar que nunca mais ajudei a gastar as calcinhas da betinha do Barreirense, embora a ela; vontade não lhe faltasse.
É verdade que a minha memória como a de todos os humanos também tem falhas, e neste caso nem foi a bebedeira que apanhei no Alburrica Bar que me levou a esquecer o nome. É mesmo verdade que consigo fechar os olhos, reviver toda a situação, mas; de forma alguma consigo recordar o nome da alma caridosa que numa celebre noite, dominado pelo álcool em excesso no sangue, teve a rara paciência de me ajudar a caminhar desde a zona do Barreiro velho, até em frente da atual Santa Casa da Misericórdia, ali bem perto da antiga clinica do meu amigo Dr. João Nunes Feijão.
Recordo sim que foi uma noite ridícula em que eu já algo, para não dizer muito, embriagado, e bem alegre, comecei a curtir com ela ainda no Bar, e viemos todo o caminho na pura balada. Ficamos ali porque ela morava próximo do local, na Avenida Dom Afonso Henriques, muito próximo da casa dos pais do Álvaro Ferreira, e o mais ridículo é que acabamos por fazer amor em cima de um banco publico em plena via publica, no meio da madrugada.
Quem conhece o local sabe que é uma das artérias com mais freqüência de transito na cidade do Barreiro, seja a que hora fora, mas que a minha, nossa, inconsciência deu para isso, lá disso não posso duvidar, porque realmente aconteceu, bem ali, naquele mesmo local, que ainda hoje preserva os mesmos bancos.
Aconteceu-me cada coisa, nessa época da minha vida, realmente!...
Recordar hoje essa especial época, até me deixa algo atônito, com alguns fatos inesperados.
Claro que com a realização das eleições as coisas acalmaram um pouco mais, e tinha que dedicar mais tempo á política que aos prazeres íntimos. Daí que face ao estado em que encontrei a Concelhia da JSD, tenha passado a dedicar-me a um tipo de política mais de acordo com relações publicas do que aquilo que possam imaginar face aos relatos anteriores.
O meu conhecimento com o Nuno Silvestre, Presidente da Distrital de Setúbal da JSD, nasce precisamente no dia das eleições para a Concelhia do Barreiro da JSD, e apesar de todas as vicissitudes políticas ao longo do tempo, mantivemo-nos sempre amigos, fora da política.
Hoje uma certa angustia me percorre, por já não o conseguir contatar á algum tempo, embora saiba que voltou a casar, desta feita com uma cidadã Cubana, e que divide a sua vida entre Almada e Havana.
Enquanto Presidente da Distrital de Setúbal da JSD; o Nuno ia vivendo das suas idéias dispersas, jogadas de bastidores, expedientes, utilizando sem controle os recursos financeiros que o pai, conhecido e respeitado advogado, lhe havia deixado, a ele e á irmã, e sempre vivendo como eterno estudante de direito da Universidade Lusíada.
A sua imagem estava sempre refletida no espelho diário da alcoolemia, com um aspecto e comportamento muito distorcido do que deveria ser um Presidente de uma organização política de juventude, e, sobretudo a de um Deputado da nação, como chegou a ser.
Embora, vezes sem conta avisado por nós, os seus verdadeiros amigos, sobre a imagem negativa que criava em volta da sua pessoa, acabou por cair nas ratoeiras que ele próprio criou com a sua teimosia, que o conduziu ao desastre político e ao conseqüente ostracismo total.
Hoje refeita a sua vida pessoal, após o casamento falhado com Helena Quintela, vive com uma cidadã Cubana e tanto quanto consigo saber esta pessoalmente bem melhor, em termos de controle pessoal.
É também por estas alturas que; sem eu saber muito bem como, me surge uma atração pessoal, pela morena tesoureira da Comissão Política, e foi assim como tiro e queda, de um dia para o outro que começamos um relacionamento que obrigou ao fim da relação que eu mantinha com a Maria do Céu, e também ao fim das minhas muitas e variadas loucuras intimas daquela época.
Ao contrario do que eu poderia imaginar, foi mesmo essa situação que criou tumulto na Comissão Política, uma situação que a oposição tinha de certa forma conseguido geral.
Elas estavam as duas na Comissão Política, o que pessoalmente de forma alguma me agradava, ainda mais que uma era tesoureira e a outra vogal, assim tinham que trabalhar em conjunto, no mínimo falar sobre verbas para a atividade de cada uma. Esta situação acabou por gerar uma autentica guerra campal no interior das reuniões da Comissão Política, tendo como centro da discórdia a minha pessoa, e logo eu que queria preservar a união da equipa.
Realmente eu, de uma forma ingênua, queria tentar conseguir manter a mesma composição do órgão, mas tal tornava-se de dia para dia cada vez mais difícil, se não mesmo impossível de atingir.
Até que constatei, que se tinha iniciado um processo de absoluta falta de confiança na Maria do Céu. Esta transmitia na integra as resoluções das reuniões da Comissão Política aos elementos da oposição, que por sua vez sem o saberem tinham elementos no seu seio que me iam transmitindo também o evoluir de toda a situação e o que se passava no lado contrario.
Decidi solucionar o problema á minha maneira, e para tal tentei que o afastamento fosse por sua livre iniciativa, mas ela, política e socialmente inexperiente, imaginava que poderia criar obstáculos, incluindo a queda da própria Comissão Política. Na verdade até ao dia de hoje eu sempre fui um ser de extremos, e quando colocado perante certas situações, eu vou até ás ultimas conseqüências para acabar com as questões, e não deixar qualquer possibilidade de retorno de cada situação.
Dessa forma defini que como ela não abandonava a Comissão Política, iria ser eu próprio a colocar o seu lugar á votação para saída e ponto final. A reunião marcada para tratar desse assunto acabou por ser bem mais tumultuada do que eu poderia imaginar. Acabou por decorrer num ritmo de insulto, a ponto de em determinado momento ela ter perdido a compostura e me ter ameaçado com uma estatueta de pedra com o busto de Francisco Sá Carneiro.
Foi então o fim, eu que nunca recuo perante uma ameaça, não resisti, e já farto de toda aquela situação, ainda mais que ela; já tinha sido demitida pela Comissão Política, por unanimidade dos presentes, perante a ameaça de levar com um busto de pedra, lancei-lhe um valente soco que ainda hoje recordo a ter levado a pura e simplesmente voar sobre a mesa e ir cair junto da porta do gabinete.
Só a pronta intervenção do meu fiel amigo e colaborador Antonio Melro, impediu nova investida minha, que exigi desde logo que fosse colocada fora da sala e mesmo das instalações da sede, assim como a marcação imediata de uma Assembléia Concelhia, para esclarecimento total da grave situação. Eu agora não a queria fora só da Comissão Política, eu exigia a sua saída da JSD e do Partido.
Obviamente que a situação passou a ser o assunto do dia, e durante alguns dias, tanto a nível local como Distrital, o tema central era que o Presidente do Barreiro, se necessário matava a cobra e mostrava o pau. Mas eu assumi pessoalmente toda a situação e não recuei um milímetro, muito embora muitos sugerissem um pedido formal de desculpas á senhora.
Eu quando assumo uma atitude, sabendo que tenho razão, seja a que titulo for, ou com quem quer que seja jamais peço desculpas a ninguém. E mais uma vez assim aconteceu.
A primeira Assembléia Concelhia, decorreu numa acalorada tarde de Sábado, com o salão a rebentar pelas costuras e com todos os elementos da oposição presentes, e tendo como assunto principal não a política local e a execução do programa da Comissão Política, mas eu fiz questão de iniciar precisamente com a situação criada por questões pessoais no interior da Comissão Política. Acabei por ganhar em toda a linha essa Assembléia, onde inclusivamente fiz votar uma moção de confiança, que acabou por ser votada com uma expressiva e esmagadora vitória minha, para não deixar qualquer duvida, fosse a quem fosse.
A Maria do Céu abandonou a sala vergada ao peso de uma expressiva derrota, bem como a oposição, que a apoiara, e se servira dela como cobaia de ataque político. Solicitou por escrito a sua saída de Militante, no dia seguinte. E como estava tão certa da sua opção política, aderiu em seguida á Juventude Socialista e ao Partido Socialista.
Acabou assim por acompanhar um dos Militantes de opção variada, José Patrão dos Santos, e que pouco tempo depois protagonizou uma hilariante ocorrência comigo, que até teve direito a destaque no Semanário Nacional Expresso.
Assim, quando, uns meses depois, convidei a Juventude Socialista para um Seminário sobre autarquias locais, foi ele próprio quem respondeu, utilizando papel timbrado da Comissão Política Nacional, e devolvendo o convite mandando-me á “merda”. O que como se entende desde logo, mereceu o fim da sua muito precoce carreira política.
Quanto o romance com a tesoureira da Comissão Política, posso dizer que foi um êxito de tal forma conseqüente que acabamos casados por 18 anos, e após divorcio amigável, somos hoje muito bons amigos, tão somente amigos.
Mas na política concreta, tudo tem que se entender de forma rápida, por parte daqueles que acabam de chegar, e nós entendemos na Comissão Política e de um modo nada demorado, que afinal os meios realmente existiam só que estavam vedados a algumas estruturas como a do Barreiro.
Tanto cartazes como autocolantes e outro material de propaganda existia já pronto, e em boas quantidades, mas era controlado pelos membros da Distrital e orientado em termos de distribuição somente para Concelhos afetos á Distrital como Almada, Seixal, Montijo e Setúbal, os restantes Concelhos, tidos como opositores da Distrital, tinham que se virar como podiam ou conseguiam imaginar.
Quem era membro da Distrital, recebia os apoios conforme os seus apetites e como o Barreiro não era membro com representação na Comissão Política Distrital, e era até então considerado oposição, estava á margem desse rateio de material.
Essa foi uma das primeiras batalhas a vencer. Conseguir convencer que não tínhamos nada que ver com o passado e muito menos estávamos simplesmente interessados ou com vontade de apoiar uma Comissão Política Distrital pelo simples fato de; potencialmente graças a isso, passar a poder ter apoios materiais. Nós assumimos desde a primeira hora que queríamos ser independentes, com idéias próprias e receber só aquilo a que tínhamos direito, nem mais nem menos, somente isso.
Nessa época, a Distrital de Setúbal da JSD tinha como Presidente Nuno Silvestre, que era oriundo de Almada, um individuo nado e criado no meio do mais puro e duro caciquismo político eleitoral, sem qualquer duvida ambicioso mas que acabou por se tornar dependente e limitado devido a varias dependências pessoais e políticas. Assim a nível pessoal a sua constante dependência do álcool era incrivelmente condicionadora da sua atuação, e por vezes tornava hilariante a sua coordenação do dia-a-dia, com constantes atrasos na sua presença a vários compromissos e falta de rigor e objetividade no cumprimento de acordos.
Por outro lado, o Nuno em termos ideológicos, vivia emparedado entre um gênio, hoje Juiz de Direito, Fernando Jacob, que era na realidade o cérebro da Distrital e de toda a sua ação política e a organização e o controle do Secretário-Geral, Antonio Mourinho. Por outro lado contava com o apoio, em termos de votos, de toda restante equipa de membros da Distrital, que ele escolhia criteriosamente e que dessa forma possibilitavam a sua manutenção e eternidade no poder.
Tenho a clara noção, de que a minha entrada no circulo político da JSD Distrital, foi inicialmente vista com muitas reservas. Eu não estava incluído na estratégia de controle, e era tido como alguém incontrolável pessoalmente, alguém com idéias próprias e que vinha de fora do sistema e que tanto poderia ajudar como prejudicar toda a nomenclatura, dependendo da minha posição futura.
Era independente demais para os gostos da maioria, que sempre funcionava com as tendências políticas de cada um.
Sei também, que foi um fato muito importante o estudo sobre ao que vinha. A aproximação de alguns Presidentes Concelhios foi desde logo para mim visível em termos de intenções, uns na tentativa de capitalizar apoios e outros para tentarem estudar e perspectivar qual poderia ser o comportamento futuro da Concelhia do Barreiro, e minha a titulo pessoal, em termos de apoio á Comissão Política Distrital de Setúbal da JSD.
Desde o inicio que o comportamento de Presidentes Concelhios, como o Simão Cortiço do Montijo, foram vistos por mim, como claros observadores a mando da Distrital. No entanto também eu desde logo decidi estudar os posicionamentos de cada um, e se no caso concreto de alguns o seu relacionamento para com a Distrital era de total sintonia, como eram exemplos Alcacer do Sal, como Alberto Carreira e o Seixal, com o Paulo Fidalgo, já, por exemplo, precisamente o Presidente do Montijo, me deixava serias reservas. Era, no entanto, o Simão Cortiço, em quem o Presidente da Distrital muito confiava, ou utilizava, mas que para mim era simplesmente um jogador que já tinha inclusivamente apoiado a oposição, e só mantinha a sua posição ao lado dos atuais lideres por claro e evidente interesse e proximidade ao poder.
Naquela época outros exemplos deste jogo dúbio eram o Jorge Alegria de Setúbal e o António Vieira que embora vindo do Seixal não era Presidente Concelhio, como o Paulo Fidalgo.
Existe um velho ditado que afirma:
“Não é com vinagre que se apanham moscas!”
E aplica-se na integra aquela época da Distrital de Setúbal da JSD, que foi confrontada com a exigência de apoios para os Sócio-Estudantis, sendo que nessa época a responsabilidade dessa área era do Paulo Fidalgo, do Seixal, Jardim Ferreira de Almada e do Helder Pisco de Setúbal.
Como a Distrital não queria criar um novo foco de oposição, o Barreiro passou a ter material para poder concorrer ás Associações de Estudantes em pé de igualdade com outros Concelhos. As quantidades iniciais eram bem diminutas, diga-se, mas era bem melhor e mais pratico do que não ter nada, e ter que manufaturar todo o material.
A curiosidade sobre a nova realidade da JSD do Barreiro era enorme, de tal forma que poucos dias após a nossa tomada de posse, éramos convidados para as mais variadas iniciativas, de onde destaco a para que fomos convidados para participar numa festa na Praça de Toiros do Montijo, em que iria estar presente o Presidente da Nacional da JSD, Carlos Miguel Coelho.
O Barreiro, tal como aconteceu ao longo dos meus mandatos, como Presidente da JSD, compareceu em força, de tal forma que até acabou por ser organizado um jogo de futebol entre as duas Concelhias.
Recordo esse importante dia, como um dos que marcam a minha vida na JSD, na política e mesmo na vida pessoal, por vários motivos.
A JSD do Barreiro passou a ser vista com outros olhos e respeitada no Distrito, e eu tive a oportunidade de conhecer pessoalmente o Presidente da JSD Nacional, que por alguns relatos já escutados, tinha alguma curiosidade de me conhecer pessoalmente.
Acabamos por ficar bem mais de; um hora a falar, sozinhos, sentados no alto das bancadas da praça de toiros, com a festa a decorrer cá em baixo, falando sobre a JSD, sobre a Juventude de Portugal, sobre a situação política geral tanto do Partido como do País, e eu ao mesmo tempo aproveitava para saber melhor com quem lidava, pois o Carlos Miguel Coelho conhecia muito bem a realidade do País, e dos dirigentes da JSD de um modo geral, e como nenhum outro membro da Nacional.
Por outro lado, eu próprio, sentia que estava a ser; estudado, pelo Presidente Nacional, nos mais variados aspetos.
Foi de tal forma importante esta conversa, que a empatia pessoal nascida nesse momento perdura até aos dias de hoje.
O Carlos é hoje um amigo, independentemente da política e acabou por tão somente vir a ser o meu Padrinho de Casamento com a Fernanda.
A JSD ficou a ganhar de forma exponencial com esta reunião e os conhecimentos ali granjeados tornaram a Concelhia do Barreiro de certa forma previligiada em relação a outras Concelhias. Eu consegui abrir algumas portas importantes, e passei a ter como que carta branca para solicitar diretamente material de propaganda na sede nacional da JSD na Rua Buenos Aires, sempre que necessário, e estou convicto de que este voto de confiança foi inicialmente dado pela amizade e confiança criadas, mas também, e, sobretudo; pelos resultados alcançados ao nível das Associações de Estudantes do Secundário, naqueles primeiros meses e anos de gestão, e também pelas posições políticas por mim pessoalmente assumidas.
A JSD do Barreiro não mais deixou de ser respeitada a nível Distrital e Nacional, e nas eleições para a Comissão Política Distrital de Setúbal, tanto a lista dirigente, como a lista opositora, abordaram e lançaram convites efetivos para a nossa participação nas listas candidatas.
O peso da Concelhia do Barreiro, em termos de votos no Concelho Distrital de Setúbal da JSD, era nessa época, muito diminuto, pois para além da inércia do Presidente anterior em termos de novas filiações, existia ainda a imagem de que o Barreiro era oposição. Nessa época dispunha-se de tão somente 3 (três) míseros votos, assim o interesse do apoio do Concelho do Barreiro não era nessa época tanto eleitoral, e muito mais político.
Nós conhecíamos bem os chamados métodos da oposição, que eram os mesmos métodos que já tínhamos derrotado nas eleições Concelhias, e começávamos também a conhecer os métodos da chamada maioria da época. A opção perante as duas propostas de participação apresentadas foi claramente voltada para a lista então liderada por Nuno Silvestre, e eu acabei por aceitar fazer parte da Comissão Política Distrital de Setúbal da JSD, tendo-me sido atribuído desde logo a responsabilidade pela Organização e Implantação a nível Distrital. A JSD nessa época, não conseguia estar implantada em todo o Distrito e, sobretudo; a zona Sul não tinha grande implantação, nem recebia grandes apoios. As Concelhias do Sul eram assim como os parentes pobres tanto da JSD como do PPD/PSD.
Nesse mandato e no seguinte a JSD cresceu a nível Distrital de forma consistente, passando a ter estruturas em todos os Concelhos do Distrito, e hoje no seio do meu grupo de grandes amigos pessoais conto entre outros, com dois ex-Presidentes Concelhios do Sul, o Alberto Carreira de Alcacer do Sal, e o Carlos Gamito de Grandola, que para além de ex-companheiro nas lides políticas é também hoje um dos meus advogados pessoais de confiança.
Foi logo nesse primeiro ano como membro da Distrital da JSD que descobri alguns métodos pouco ortodoxos da política dos caciques. Assim existiam Concelhos com muitos Militantes inscritos nos cadernos eleitorais, mas percentualmente pouco ativos em termos de participação, quando chamados a isso, pelo que saltava desde logo á vista que algo não batia certo em termos de confronto de listagens e realidade de participação.
Por exemplo: na Concelhia de Almada existia a ironicamente conhecida lista telefônica. Era Almada um dos casos mais gritantes, e desta forma a estratégia permitia uma larga e maioritaria representação no Concelho Distrital, sendo que só esse Concelho, nessa época, detinha mais de 40% dos representantes ao Conselho Distrital, existiam moradas com mais de 30 militantes inscritos, como eram exemplos a casa do Nuno Silvestre, Julio Barbosa, irmãos Nascimento e outras moradas. O mesmo acontecia em Setúbal, no Seixal e no Montijo.
As listagens de Militantes eram controladas por elementos da máxima confiança do Presidente da Distrital, e por coincidência todos eles eram oriundos de Almada. A máquina Distrital estava assim também dominada por uma clara maioria de membros, também oriundos de Almada, que a memória ainda me deixa recordar como o Presidente, Nuno Silvestre, Vice-Presidente, Fernando Jacob, Secretário-Geral, Manuel Mourinho, e Vogais, Jardim Ferreira, Duarte Correia, e ainda, outro, elemento que esse sim a memória já atraiçoa em termos de nome. A Comissão Política Distrital era dessa forma composta por nada menos do que 6 elementos em 11, uma obvia e clara maioria.
Acabamos assim por descobrir que existiam militantes reais e fabricados, para encher simplesmente as listagens. Assim fiquei certo de que a política era uma nobre arte da sacanagem, e a ciência do possível, onde quase tudo é possível e onde quem tem o poder o exerce sem ter duvidas e dessa forma domina quem é mais astuto e quem mais consegue utilizar os benefícios e as possibilidades da direta proximidade com o poder.
Não posso provar quem individualmente montou esse esquema de fabulação e fabricação de militantes em termos de Almada e outros Concelhos. Claro que sou livre de pensar e imaginar, no entanto a situação tinha ramificações noutros Concelhos, onde um dos dirigentes locais chegou a adulterar a sua própria data de nascimento para dessa forma poder manter-se por mais um tempo em efetividade de funções na JSD, que nessa época tinha como idade limite os 30 anos. Falo do António Vieira do Seixal, que ao adulterar a ficha, mudou o ano de nascimento, passando a ficar um ano mais jovem. Claro que a falcatrua foi detectada, por mim próprio, e quando confrontado, a historia terminou por ali, passando novamente a ficar com a idade correta, e portando já fora da JSD.
A Concelhia do Barreiro crescia no numero de Militantes de forma legal, e nós ao mesmo tempo víamos a continuação do crescimento desordenado e pouco ortodoxo de alguns Concelhos. Com este crescimento o numero dos nossos representantes no Concelho Distrital crescia também, mas como que duplicava para os outros, e quando confrontada a percentagem de Militantes existentes nas listagens com a realidade, das presenças nas Assembléias Concelhias, ou noutro tipo de contatos, os números de forma alguma batiam certo.
Curiosamente, e embora fosse da minha área de responsabilidade, a organização e implantação distrital, e tivesse por mais de um vez solicitado listagens dos Militantes, nunca consegui ter em meu poder uma listagem de militantes da JSD do Distrito de Setúbal, que me fosse entregue oficialmente, ao contrário do que veio a acontecer anos mais tarde com a listagem dos militantes do PPD/PSD.
Toda esta maquina era controlada pelo Secretario-Geral Manuel Mourinho, que com o maior dos segredos do mundo, controlava esta situação, embora eu tenha acabado por ter acesso a uma copia dessa famosa listagem, arranjada por um dos colaboradores, em quem até as mãos colocariam no fogo, e que obviamente não irei, nem mesmo agora aqui divulgar.
Naquela época só uma operação de refiliação completa conseguiria colocar na legalidade todas as Concelhias, fato que eu apresentei como proposta, e não foi aceite naquela época, mas que veio a acontecer anos mais tarde no Partido, por iniciativa do Secretário Geral Rui Rio, por se ter verificado esta mesma situação fantasmagórica.
Era bastante visível que cerca de 35% dos Militantes estavam inscritos nas listagens imaginarias de alguns Concelhos.
No caso concreto do Barreiro, quando verificamos que não existia outra foram, pois ninguém queria alterar o sistema, optamos por também acompanhar essa imensa fraude, e quando na realidade se tinha direito a 7 ou 8 Conselheiros Distritais, nos com essa transfiguração aumentávamos para 9 ou 10.
A realidade era a mesma de outros Concelhos, mas aqueles, no entanto acabavam por apresentar quase o dobro das falcatruas e obviamente dos representantes.
Assim eu, e o meu núcleo duro, chegamos á conclusão de que; pouco adiantaria continuar a tentar manter uma legalidade, que ao fim e ao cabo ninguém respeitava, e só nos prejudicava, uma vez que ninguém retirava das listagens os Militantes, que tinham pedido exclusão, morrido, ou que estavam lá inscritos como fantasmas. Por outro lado a JSD do Barreiro acabou por fazer o mesmo que todos os outros já haviam feito á muito tempo. E de fato comprovo que injetou alguns militantes fantasmas, sendo os mesmos perfeitamente controláveis por nós, uma vez que todo o mundo na Comissão Política Concelhia, com responsabilidades máximas a esse nível, sabia quem tinha sido inscrito como Militante real ou Fantasma. Existindo inclusivamente uma listagem chamada de fantasma. Essa situação foi numa perspectiva máxima de que o Barreiro chegou a ter 15 Conselheiros Distritais, sendo que três destes eram pura ficção, portanto aproximadamente cerca de; 75 militantes eram fantasmas.
Obviamente que a Distrital um dia, através do Secretário-Geral, Mourinho, apercebeu-se dessa situação, mas nada podia fazer pois todos sabiam que nós sabíamos que eles sabiam que nós apenas tínhamos feito igual a tantos outros Concelhos, e nesse aspecto o Secretário-Geral estava metido até ás orelhas em todo aquele escabroso processo.
Quando hoje me falam de política limpa, eu só posso sorrir, sorrir muito face a tudo quanto sei que pode acontecer dentro da máquina da política, fatos para muitos impensáveis são, no entanto, cozinhados e consumidos no interior do mundo da política e muito em especial na situação da inscrição de Militantes e também, e sobretudo no financiamento partidário.
Enquanto responsável na JSD do Barreiro, conseguimos apurar a existência de militantes que conseguiam estar inscritos em varias organizações políticas de juventude ao mesmo tempo. O caso mais incrível era; o de um jovem que conseguia estar inscrito e ter participação ativa na JSD, na JS e na JC, chegando mesmo ao cumulo de conseguir ser Militante ativo na JSD e no PPD/PSD e ser eleito Presidente de um núcleo da JS. Falo claro do famoso José Patrão dos Santos “Zé Gú”, o homem da carta do “altamente cagando” que me foi dirigida, e que mereceu destaque nacional no semanário Expresso.
A organização do País e nomeadamente da política, permitia situações hilariantes que até á bem pouco tempo continuavam a acontecer, porque a todos interessava manter este tipo de acontecimentos.
Hoje, conhecedor de um pouco da atual política brasileira, revejo muito claramente por aqui, alguns dos vícios existentes no Portugal de á alguns anos, e mesmo alguns vícios existentes ainda no Portugal de hoje, ao nível político.
Encontram-se ainda hoje alguns jogos de caciques políticos. Tenho que reconhecer, no entanto, que no caso particular do controle de filiações, em partidos políticos, o Brasil ganha a Portugal nesse combate direto. A obrigatoriedade da publicação publica e periódica de listas de militantes, combate dessa forma de um modo muito claro e objetivo, a duplicidade de inscrições, ou ainda a Militância não desejável ou fictícia, e tudo isto de um modo muito eficaz, muito embora não respeite a privacidade de cada um.
Com o passar do tempo tornei-me um verdadeiro especialista na mais renomada arte das artes da política e com isso a JSD ganhou militantes reais e ficcionais, no entanto mais uns do que outros, e tornou-se uma estrutura respeitada e com um manancial de quadros técnicos que hoje dão cartas nos mais variados e destacados pontos da vida publica.
Também a nível financeiro a JSD criou meios de financiamento até então desconhecidos, e levou a cabo iniciativas impensáveis até aquela época.
De entre os vários motivos de orgulho destaco as festas da cerveja, com larga capacidade de mobilização, torneios de futebol com a participação inclusive em importantes torneios locais, como nos torneios do 31 de Janeiro e do Luso, com resultados muito positivos, inclusivamente com a conquista de um troféu de campeão de serie no torneio do Luso, e ida direta á fase final do mesmo.
Para sempre não posso deixar de recordar o fato de conseguir que a própria oposição interna, passa-se a colaborar de um modo efetivo nas nossas iniciativas, bem como a liberdade de criação dada ás suas próprias iniciativas.
Recordo assim com alguma emoção o saudoso Carlos Couto, adversário que venci num dos atos eleitorais para a Comissão Política Concelhia, e que mesmo assim, organizou de forma tão brilhante e inesquecível as Iª e IIª Festas da Cerveja da JSD do Barreiro, entre outras iniciativas.
Por outro lado, a JSD que até então se mostrava constantemente amorfa em termos políticos, começou a posicionar-se de forma ativa e racional e com claros posicionamentos sobre os problemas concretos que afetavam os jovens daquela época.
A sede da JSD do Barreiro passou a ser tida como um ponto de referencia diário tanto para militantes como para simpatizantes ou mesmo para jovens sem opção política que ali encontravam resposta e algum encaminhamento técnico em termos educativos, profissionais e mesmo de resolução de problemas sociais.
Virou um ponto de encontro certo para a juventude, que ali podia conviver na máxima liberdade, discutindo os seus problemas e obtendo um tipo de companheirismo raro noutros locais.
Foi assim que uma noite, um grupo de jovens procurou informação sobre um problema que os estava a afetar diretamente. O assunto tinha que ver com a freqüência de cursos profissionalizantes remunerados que estavam a decorrer na Casa dos Rapazes, situada na Quinta da Lomba em Santo André.
Estes jovens sentiam-se enganados na remuneração que lhes estava a ser atribuída, nos cursos de formação financiados pela Comunidade Econômica Européia, e que estavam a decorrer nessa instituição dirigida pelo conhecido Padre Azevedo.
No final de cada mês, obrigavam-nos a assinar recibos de um determinado valor, sendo que apenas lhes entregavam realmente metade dessa verba.
Depois de empenhada investigação chegou-se á conclusão que aquela situação era já uma pratica comum, levada a cabo em outras ações de formação anteriores, por parte do Padre Azevedo e do seu “cão de fila” Sr. Barata, responsáveis pela organização e desenvolvimento daqueles cursos.
A JSD do Barreiro assumiu a defesa desinteressada dos jovens, sendo que á data nenhum deles era Militante da JSD. Até hoje eu guardo religiosamente os documentos originais de todo esse processo.
Os alunos assinaram declarações relatando toda a situação, que foram devidamente reconhecidas notarialmente e a que se juntaram documentos comprovativos da falcatrua, tais como recibos assinados e comprovativos dos valores efetivamente recebidos e que nada tinham de idêntico com os valores apresentados nos recibos.
O assunto acabou por virar escândalo na comunicação social nacional, uma vez que as verbas ainda por cima eram da Comunidade Européia. O problema acabou por ser resolvido, contando com a nossa intervenção junto de várias entidades, incluindo o Departamento de Acompanhamento Fundo Social Europeu, e entre outras figuras, a intervenção pessoal do próprio Bispo de Setúbal, D. Manuel Martins. Uma figura rigorosa que ao principio se mostrou algo intratável, mas que colocado perante a minha objetividade como Ateu e os documentos factuais, não teve duvidas na resolução do assunto, tendo acabado por ficar meu amigo pessoal até ao dia de hoje.
Este assunto acabou por gerar uma grande luta interna com o Partido, que tomou inicialmente a posição de defesa do Padre Azevedo. Não quiseram sequer tomar conhecimento direto dos fatos sobre o assunto, chegando ao ponto de me lançarem ameaças pessoais, atitude levada a cabo pelo Presidente da Concelhia do Partido á época João Monteiro, e por Fernando Cruz o seu Vice-Presidente.
Estas duas personagens chegaram ainda ao incrível de se deslocarem a uma reunião com o Secretário-Geral do Partido, naquela época, Dr. Dias Loureiro, como que para pedirem a minha cabeça, mas; eu, tendo sido antecipadamente avisado dessa intenção, já tinha feito chegar cópia de toda a documentação ao Presidente Nacional da JSD e ao gabinete do Secretário-Geral do Partido, que amavelmente os recebeu, e de um modo civilizado os devolveu ao Barreiro com uma valente reprimenda.
Foi então que nos apercebemos que se tinha mexido em muitos interesses pessoais, instalados ao longo do tempo. Na mesma ocasião tinha-se também descoberto uma serie de vigarices envolvendo Militantes do Partido, com uma rádio local, ligada a uma instituição de solidariedade social, envolvendo ainda um responsável da Repartição de Finanças Local, que também dava cobertura a toda a situação.
Tudo acabou por ser descoberto e resolvido com amplas vitórias da JSD e dos muitos jovens que estavam a ser afetados diretamente em termos pessoais.
Lamentavelmente, e mais uma vez a igreja católica, deu cobertura a salafrários e vigaristas, e esse famoso Padre Azevedo, continua a ser ainda hoje o responsável local por aquela paróquia.
Ao longo dos muitos, anos que por ali se encontra, talvez já bem mais de três décadas, continua a fazer constantes peditórios para construir uma igreja no local, eu diria que face ao tempo decorrido e ao dinheiro angariado, e que ninguém controla, já podia ter talvez construído uma catedral.
Já nos anos 80 do século passado, as suas trapaças eram de todos conhecidas. Chegava ao cumulo de abastecer o seu automóvel particular numa conhecida bomba de combustíveis da cidade, em que trabalhava na época o Luis Filipe, solicitando o abastecimento real de mil escudos de gasolina e a exigência da sistemática emissão de recibos com valores muito superiores, normalmente de cinco mil escudos, e sempre passados em nome da Paróquia de Santo André.
Curioso o fato do Sr. Barata ter, apesar de todas as circunstancias, vindo a ser o candidato do PPD/PSD para a Junta de Freguesia, nas eleições autárquicas seguintes, como curiosa era a situação do responsável pela instituição de solidariedade social de Palhais, um conhecido Dentista, Dr. Valentim, que durante muitos anos foi o candidato local do PPD/PSD nessa Freguesia.
A JSD do Barreiro viveu nessa época uma luta diária com o Partido a nível Concelhio, no sentido de exigir o cumprimento da legalidade interna e mesmo externa, o que garantia o nascimento de inúmeras guerras pessoais.
Mas naqueles históricos tempos da JSD nem tudo era estresse, pois também aconteciam momentos inolvidáveis, contando com a participação de algumas personagens inesquecíveis.
Será que alguém que tenha vivido esses momentos consegue esquecer a importância eu tinha para aqueles militantes a presença, por exemplo, de um Licinio Seabra, nosso incansável “motorista” com o seu insubstituível Morris Mini de cor verde. Eu penso que absolutamente ninguém!
Filho de um casal de classe média alta, o Licinio Seabra recebia uma lauda mesada para não perturbar a família em Lisboa, e assim veio parar a casa da avó no Barreiro.
A sua verdadeira família eram os amigos e claro a JSD. Acabou por ser adotado devido á sua grande prontidão, servilismo e sociabilidade, além da solidariedade, pois sempre que alguém necessitava de um transporte, sabia a quem podia recorrer. A sua inteligência deveras limitada para a área política, tinha larga margem de progressão e aceitação na área da informática, e tudo o resto era um desastre.
Quanto a conquistas amorosas:
Bom!
As jovens optavam por manter um conhecimento limitado acerca da sua pessoa, de forma a garantir sempre um transporte motorizado pontual e garantido, mas quanto ao resto; tudo ficava mesmo só por isso.
Foram conhecidas as suas empenhadas paixões, quase todas com triste fim, ou dizendo melhor, sem inicio, como a que manteve pela “Bordolinda”. Esta era uma paixão comungada com o José Reis Marques, por uma jovem bem anafadinha, nos seus noventa e muitos quilos, que lhes dedicava alguma atenção, mas que a timidez do Licinio acabava por afastar, na chamada hora H, por sua vez o “Zezé” estragava tudo com; os ataques de asneirada derivados dos vapores alcoólicos.
A Bela, ex-namorada do meu amigo, Pimenta, dedicava muita atenção a meio mundo, mas era o Licinio quem fazia simplesmente de motorista particular, garantindo ida e vinda para casa no Lavradio, fosse a que horas fosse, mas quanto a paixão e romance; nada.
Depois nasceu uma paixão do tipo “Romeu sem Julieta” pela Noelia Trindade, que não adorava muito mais do que o transporte aconchegante no Morris do Licinio, entre Coina e o Barreiro, quando queria deslocar-se á cidade, e também uns passeios aconchegantes de automóvel um pouco por todo o Distrito, tendo o Licinio como motorista e segurança.
Recordo ainda mais umas duas ou três grandes paixões, que no final não se traduziram em nada de concreto. Acabou por casar com uma enfermeira divorciada, bem mais velha que ele, e que já tinha uma filha com mais idade que a dele próprio.
As suas aventuras eram hilariantes, pois como profundamente ingênuo, propiciava-se a cair em todo o gênero de trapaças que lhe fossem preparadas, e foram muitas as ocorrências ao longo do tempo, geralmente quase todas com grande colaboração do seu carro “Austin Mini” como alvo principal.
Um dia; um grupo de amigos seus da JSD, sabendo do seu grande apego ao automóvel, resolveram simular o seu desaparecimento, e ainda por cima de um local publico, bem movimentado, junto da Boleira do Parque no centro do Barreiro, em frente ao Parque Catarina Eufemia.
Aguardaram no café a chegada do Licinio, e após conseguirem prender a sua atenção e presença no café, combinaram-se e não contentes com o simples desvio da viatura, resolveram colocar a mesma dentro do próprio relvado do Parque.
O mais incrível foi terem efetuado a mudança de local de estacionamento totalmente á mão, com a sua colocação no meio do relvado.
Claro que quando os transeuntes viram um automóvel estacionado no meio do relvado do parque, começaram a juntar-se muitos curiosos a comentar e questionar o insólito fato. Assim, e depois da obra realizada, foram regressando á mesa do café, e quando já estava reunido um bom grupo de curiosos, e quase como se fosse normal a situação, comentaram:
“... vejam bem, um louco estacionou o automóvel no meio do relvado do parque debaixo das arvores!...”
O Licinio escutou e até acabou por também comentar, que realmente só um louco poderia fazer um trabalho daqueles. Só apareciam malucos no Barreiro!
A multidão continuou a juntar-se e a questionar a situação, bastante estranha, foi então que o pessoal presente na mesa resolveu decidir ir embora para conseguir assisti, no próprio local, á reação do LIcinio, quando visse que era o seu próprio carro que se encontrava no meio do relvado.
Ao sairmos do café e ao não ver a viatura no local onde a tinha estacionado, o seu primeiro pensamento foi que lhe tinham roubado o carro e foi a risota geral perante a sua cara de aflição.
Entretanto para tudo ficar ainda mais completo, a polícia chegou ao local, para resolver a situação do carro no meio do relvado, e nós de um modo o menos estranho possível incentivamos o Licinio a apresentar mesmo ali uma denuncia pela falta do seu carro.
Finalmente decidiu apresentar queixa junto da patrulha policial e quando se dirigiu ao policia, a primeira pergunta deste foi se o seu carro não seria um Austin Mini de cor verde.
Quando ele respondeu que sim que era um Austin Mini, de cor verde, o policia não agüentou mais, e já bastante irritado desatou a falar-lhe bem alto:
“... então o senhor esta a brincar comigo, estacionou o seu carro no meio do parque, mesmo em cima da relva, e quer agora brincar comigo!”
Foi o delírio total, ver ao cara do Licinio a tentar explicar aos policias da patrulha que não tinha nada que ver com a situação, pois estava no café descansado, quando este tinha desaparecido, e que o tinha estacionado, bem li junto do passeio, e não no meio do relvado.
Tudo acabou na esquadra, e felizmente com um final positivo, pois a policia acabou por entender ter sido mesmo uma brincadeira que alguém lhe tinha feito, sem o seu consentimento.
Na verdade ele sofria muitas brincadeiras, e normalmente por causa do carro, e com este estacionado junto da Boleira do Parque, que era um dos seus locais preferidos de convívio.
Numa outra ocasião, o José Reis Marques, que nessa época andava meio político com ele, resolveu aguardar que estivesse bem entretido no interior do Bar Alburrica, nosso ponto de encontro nessa época, e veio com outros elementos junto da viatura. Despejou os 4 pneus, e ainda por cima com a ajuda do Carlos “Tete” retiraram todos os pipos dos pneus.
Já altas horas da noite, ele decidiu regressar a casa na companhia do amigo Bagorro e deparou com o carro naquele estado, com os 4 pneus em baixo.
Resolveu, no entanto, encher os pneus e com a ajuda de uma bomba de pé começou a tentar encher um dos pneus. Somente quando terminou é que constatou que os pneus não tinham os pipos, e como tal não podia fazer nada naquele momento, pois os pneus não retinham o ar.
Foram para casa a pé, tendo no dia seguinte solicitado o apoio de um funcionário de uma reparadora de pneus, para se deslocar ao local, para recolocar os pipos em falta e encher os pneus.
Claro que muitas vezes lhe esvaziavam os pneus, embora somente nessa noite lhe tenham roubado os pipos. A sua vida com o Austin Mini era que nem a do famoso cômico Inglês Mister Been, uma tormenta tal a quantidade de acontecimentos que lhe acabavam por surgir; como as pegas das portas untadas com massa consistente ou óleo dos travões, ou como incrivelmente lhe aconteceu uma vez, enquanto jantávamos bem longe do Barreiro, e lhe untaram as pegas com dejetos de cão. Outras vezes tapavam a saída de ar do tubo de escape para o ver atrapalhado, para além de mais uma boa dúzia de situações bem comuns de acontecerem a alguém com o caráter como o seu.
Agora nada se pode comparar com o que aconteceu um dia em Setúbal, junto da Sede Concelhia. Era um domingo, e tinha lugar um Conselho Distrital da JSD, e alguns elementos do Barreiro foram para Setúbal de comboio, outros de automóvel. Nesse dia o Licinio ficou de dar boleia no regresso a mim, á Fernanda ao Rui Vilela e também da Drª Lurdes Marques, namorada nessa época do Rui Vilela, e também do inseparável amigo José Marques, que de um modo algo suspeito á ultima da hora desistiu da boleia, tendo regressado com o amigo “Tete”.
Nesse dia o Carlos “Tete” deslocou-se a Setúbal na sua viatura juntamente com outros elementos da Concelhia do Barreiro. De salientar desde já que o Carlos “Tete” era um ótimo mecânico, aliás ainda hoje é essa a sua profissão, sendo mesmo um conhecido industrial do ramo, na zona de Santo António da Charneca.
O que na realidade aconteceu; foi que durante a realização do Conselho Distrital, o “Tete” conseguiu abrir o carro do Licinio e trocar os cabos das velas. O resultado na hora do impacto foi bastante positivo, ainda mais que o Carlos conseguiu fazer crer a todos que a situação nada tinha que ver consigo.
Entretanto na hora de regressar ao Barreiro, a situação tornou-se deveras hilariante. Cada vez que o Licinio dava á chave, para o motor de arranque acionar o motor do carro, era uma chuva de ‘rateres’ bem sonoros e com faíscas a sair do escape, um espetáculo incrível.
Ninguém se conseguia conter sem rir a bom rir, perante a situação e a imagem desolada do Licinio. O barulho foi tanto com as explosões que saiam do carro que; os moradores dos edifícios próximos ao local vieram para as janelas e varandas observar o acontecimento e como a situação se prolongasse ameaçavam o Licinio com a chamada da policia para terminar com aqueles imensos ruídos de explosões, na via publica.
Todo o mundo ria sem parar e o Vilela que não conseguia parar de rir, chegou a rebolar no meio do sujo asfalto sem se conseguir conter em pé de tanto rir.
Eu próprio garanto que cheguei a chorar de tanto rir. Como não havia oficinas abertas por ser domingo, o Licinio acabou por aceitar a nossa sugestão de; deixar a viatura ali estacionada e vir no dia seguinte com um mecânico resolver a situação.
Finalmente regressamos de comboio ao Barreiro, sem deixar de rir toda a viagem perante a incrível situação e o constante lamento e desalento do Licinio.
Já no Barreiro jantamos num restaurante que ficava no centro da cidade, e eis que de um modo estranho surge o Carlos “Tete” e o José Marques, para tomarem de modo disfarçado, consciência dos resultados da brincadeira, assim como se fosse ocasional a sua presença, aquela hora e naquele local.
Desde logo o “Tete” se prontificou em resolver a situação, naquele mesmo dia, para o que sugeria irem imediatamente a Setúbal desde que; o Licinio paga-se do seu bolso o combustível do carro do “Tete” e um petisco e uns copos posteriormente, lá pelas bandas das terras do Sado.
Acertaram a deslocação, e lá partiram os três para Setúbal, com as despesas da viagem todas a cargo do Licinio. Obviamente que a situação foi prontamente solucionada pelo “Tete”, sem que o Licinio tivesse a mais leve suspeita de que a origem do problema tinham sido aqueles dois supostos amigos, que agora o acompanhavam na resolução do problema.
Somente dias depois tomou conhecimento dos causadores da situação, e como já se repetiam muito as brincadeiras, passou a olhar para o Carlos “Tete” com outros olhos, e mesmo o José Reis Marques, que era um dos seus inseparáveis amigos veio a descer alguns, muitos, pontos na sua consideração.
Mas o Licinio daquela época era também um grande desportista, e como tivesse sido convocado para participar nos jogos de futebol entre Concelhias, que se iam disputar no Barreiro, logo se deslocou a uma boa loja de artigos desportivos e adquirir umas botas e restante equipamento, quase de um profissional. Chegado o dia do jogo, a equipa, onde foi incluído, decidiu, no entanto; deixar atuar o “craque” quanto muito uns singelos 10 minutos.
Foi então a chamada lamuria total, por parte do Licinio:
“... ora eu com um equipamento profissional completo da Adidas, e nem cheguei a jogar 10 minutos!...”
Reconheça-se que quem mais abusava da disponibilidade do Licinio era o José Marques que fazia dele um autentico ‘moiro’ de paciência e seu motorista particular e oficial. Por vezes a noite acabava com as normais bebedeiras do José Marques “Zezé”, que em alguns dias resolvia levava a cabo algumas aventuras dignas de um artista de circo, como, por exemplo; conseguir urinar da janela do carro, com este em andamento, ou colocar a cabeça de fora e vomitar para o pára-brisas, deixando o Licinio sem visbilidade para poder continuar a conduzir, ou tentar vir de Lisboa ou de Setúbal, até ao Barreiro, sempre com os pés fora da janela do carro, entre outras aberrações.
Outro amigo que com a sua presença compunha muito bem a imagem do carro do Licinio, era o Tomé, que debaixo dos seus cento e muitos quilogramas, ao entrar e sentar no Austin Mini, deixava o lado do pendura de rastos na estrada, com a suspensão vergada á sua imponência para além de encher e extravasar completamente o lugar do pendura com a sua imensa área corporal.
Realmente aquele carro graças ao seu proprietário e algumas das suas companhias era mesmo mítico, e de entre muitas outras ocorrências registro ainda; o dia em que conseguiram amarrar um depósito plástico rodado de lixo á traseira do seu carro. Quando ele arrancou foi um burburinho tremendo e como só parou uns metros á frente, foi indescritível a sua imagem a olhar para o carro e para o deposito do lixo amarrado a este.
Numa outra ocasião resolveram amarrar o carro a um poste de iluminação publica, ainda por cima numa rua inclinada, próximo do Bar Alburrica. O Licinio quanto mais acelerava a viatura, maior era a risota geral de todos os presentes, uma vez que o carro não conseguia sair do local, fazendo imenso barulho com as rodas motoras, uma vez que os pneus arrastavam no alcatrão chegando mesmo a levantar fumo. Nesse dia ele ficou como que possesso perante a figura que tinha feito e a brincadeira que lhe tinham feito.
Nesse mesmo local, num outro dia, aconteceu o mais incrível que se possa imaginar, uma vez que o Vilela deixou o Licinio estacionar o seu carro, na época um Citroen praticamente novo. O Licinio, não encontrando outro local, estacionou a viatura praticamente em cima da esquina, próxima da casa do Helder Madeira, e a viatura da recolha do lixo, quando passou no local, viu-se impedida de circular. Como estivesse no interior do Bar, de nada se aperceberam, e a viatura do lixo acabou por passar arrasando o painel lateral do carro desde a frente até atrás. Parecia que alguém tinha feito uma obra de arte nas embaladeiras e nas portas. O Licinio e o Vilela quando vieram recolher a viatura e olharam para esta, iam morrendo, tal o estado em que se encontrava. Um morador do local deu a boa nova que tinha sido a viatura municipal da recolha do lixo, e quando confrontaram o motorista, este simplesmente respondeu para se deslocarem aos serviços para solicitar a reparação, uma vez que ele tinha ainda toda a noite para andar a recolher lixo, e não tinha tempo para os atender. Foi a risota geral.
Naqueles anos de ouro a JSD teve muitos militantes que se poderiam considerar ingênuos, agora eu considero que nenhum se pode comparar nesse campo ao Licinio Seabra, uma figura verdadeiramente lendária.
Outra figura mítica da JSD, naquela época era o José Reis Marques, “Zéze”, e curiosamente a sua vida como que funcionava a dois tempos, ou seja a sua vida sóbria e a sua vida ébria.
Conviver com o Zé Marques sóbrio, era bem agradável e divertido, mas conviver com a mesma pessoa alcoolizada era algo do outro mundo, e muito difícil de descrever.
Desde que sofreu um acidente de viação na viatura do Carlos Camarão, o “Zezé” ficou com dupla personalidade, virou uma outra pessoa, um ser totalmente diferente daquele individuo que todos conhecíamos. A sua capacidade de domínio pessoal e, sobretudo; o raciocínio rápido foi profundamente afetado, o seu poder de absorção de bebidas alcoólicas pelo organismo foi também profundamente alterado, e a mesma pessoa que antes bebia com moderação e controle, passou a ser quase um alcoólatra compulsivo, pois quase diariamente era impelido a consumir bebidas alcoólicas em quantidades apreciáveis.
Pior do que tudo isso era a sua falta de auto-controle pessoal que o transportava para estádios diversos de personalidade, iniciando com uma boa disposição e cavalheirismo total, passando depois para um estádio de euforia divertida, depois uma euforia já passando o absurdo e num estádio já mais avançado entrava na situação incomoda e sobretudo asneirenta, não medindo locais ou pessoas presentes como se estivesse a movimentar-se e agindo inconscientemente, de modo totalmente descontrolado em termos sobretudo de linguagem.
O seu fascínio pelo consumo de álcool era tamanho que chegou a manter contas abertas em vários bares do Barreiro, inclusivamente com garrafas guardadas, efetuando religiosamente o pagamento das mensalidades no preciso dia em que recebia o vencimento, e abrindo de imediato uma nova conta a ser encerrada no final do mês seguinte.
Recordo as suas diversas fases ao longo do tempo que se iniciaram pelo consumo compulsivo de cerveja, passando depois ao wisqui, vodka, gim, rum, e acabou por entrar mais tarde no consumo de aguardentes velhas e bebidas brancas, e na última fase de que ainda me recordo andava já no vinho tinto.
Obviamente que devido a alguns comportamentos mais ousados, alguns bares proibiam a sua entrada sempre que o seu estado aparentava encontrar-se já em adiantado estado de decomposição em termos de alcoolemia.
Noutros locais, e por serem públicos e de fácil acesso, a sua entrada não podia ser vedada, no entanto quando se iniciava o período de iminente caos, procuravam resolver o problema sem causar muita agitação visual. Claro que nós próprios numa primeira fase, quando o encontrávamos já perante um estado mais avançado na euforia, tentávamos retira-lo dos locais, o que era sempre muito difícil, pois nunca se considerava alcoolizado, isso era uma palavra que jamais existia no seu vocabulário, mesmo que estivesse quase a cair de ébrio.
Um dia, alguém com alguns conhecimentos sobre o assunto, nos disse que; muitos indivíduos nas condições do José Reis Marques, se apanharem uma bebedeira monumental, diria violenta, tem como reação direta, durante muito tempo evitarem repetir a experiência, para além de que a sua resistência ao álcool é normalmente inferior á capacidade de um individuo que não se embriaga com freqüência, que embora mais fragilizado por esse fato, como não tem problemas de índole mental, agüenta mais a ingestão de álcool.
Pensamos então testar essa teoria, e para isso combinamos um jantar na tasca do Sr. António da “Língua” em Santo André, curiosamente anos mais tarde vim a morar numa casa mesmo fronteira a essa nossa catedral da carne grelhada. Da equipa dessa famosa noite, designada para levar a efeito o teste psicológico versus alcoólico, faziam parte para além de mim, o Carlos Vitorino, Licinio Seabra e o Antonio Melro. Foi, no entanto, um teste para nunca mais se voltar a repetir pois; ele acabou por comer por cinco e beber por dez, e nós é que acabamos por pagar toda a conta, e também fomos nós que acabamos embriagados, e ele ficou são como um pero.
Existiam locais de referencia para o “Zezé” como o Bar Alburrica e a Boleira do Parque, e das muitas e variadas situações registradas nas suas visitas quase diárias ao Bar Alburrica, local onde normalmente entrava sóbrio e acabava por sair de rastos, não se pode esquecer os seus duetos com o cantor “Nelinho”, nas conhecidas canções ‘Leãozinho’ e ‘Menina estas á janela’ no entanto para além da sua componente artística, acaba por deixar sempre a marca da sua presença, com uns quantos “dixotes” a umas quantas presenças femininas que lhe caíssem no gosto, e claro mais umas quantas brincadeiras normalmente pouco ortodoxas.
A sua noite mais memorável, pela negativa, foi dividida entre os bares de Alburrica e do Clube de Vela. Tendo iniciado a noite no Bar Alburrica, e como já estava deveras bem alcoolizado, tentamos retira-lo do local afim de o conseguir levar para casa, mas as nossas inúmeras tentativas não deram êxito, como tal decidimos ir embora sem ele e partimos para o Clube de Vela, na esperança de que não vendo muita gente conhecida no local, se aborrecesse e fosse finalmente para casa pelos seus meios.
Não podíamos estar mais enganados. Como se tivesse ‘faro’ como os bons cães perdigueiros; cerca de meia hora passada, e ele fez a sua entrada gloriosa no Clube de Vela, e vinha na sua máxima força, gritando a plenos pulmões pelos nossos nomes logo que transpôs a porta de entrada, e nos viu junto do balcão. Como todo o mundo estava sentado ao balcão, e com o estabelecimento super cheio, pois decorria um espetáculo ao vivo, ele não se fez rogado e acabou por também conseguir sentar-se junto de nós.
Continuou a beber, muito embora a nosso pedido, junto dos empregados, chamando á atenção para o seu estado, e como sempre acontecia, o álcool acabava por lhe provocar profundos desvios comportamentais. Em determinado momento, e felizmente com o som da musica ambiente alto, e como o empregado do balcão finalmente se recusou a atender um seu novo pedido de bebida, desatou aos gritos:
“... eu quero um batido com sangue de uma virgem ‘mestruada’, tem que haver alguma na sala, vá apalpar e traga lá o batido rápido!...” repetia sem parar para um dos empregados do balcão.
Ninguém se conteve e de imediato todo o mundo pagou a sua despesa e saiu.
Ele não queria sair, e ainda por cima não parava de gritar, portanto ali ficou a dar o seu espetáculo muito particular.
Soubemos no dia seguinte que, obviamente não bebeu o batido tão especial, e a segurança do local teve um imenso trabalho para, o conseguir colocar fora do estabelecimento, e só mesmo após lhe terem aviado mais uma ou duas bebidas, que não obviamente o solicitado batido, o tinham conseguido convencer a sair, para além de que nenhum taxista assumia levar o individuo para casa naquele estado.
As suas cenas com vertente ordinária, quando alcoolizado de forma incontrolável, eram assim mais freqüentes que o desejável, sendo que numa outra ocasião em plena Boleira do Parque, e depois de um laudo almoço bem regado, e seguido de uns quantos digestivos, pretendia beber um café e mais um acompanhamento, ou seja um imenso balão de brandy velho. No entanto, nessa época, a Boleira esgotava a sua capacidade durante a tarde, em virtude de as senhoras da chamada sociedade barreirense ali se deslocarem para lanchar tranquilamente, enquanto colocavam as conversas de comadres e bisbilhoteiras em dia.
O “Zezé” perguntou ao insubstituível empregado, Sr. Alexandre, se por acaso iria vagar alguma mesa para ele se poder sentar, e como foi informado de que nos próximos minutos, tal no estava programado acontecer, desde logo respondeu que ia sim vagar, era só aguardar que ia vagar logo, logo. Então resolveu desatar aos gritos do balcão:
“... eu quero é ‘cona’! Quero uma São Domingos (aguardente) e a ‘cona’ de uma dessas velhinhas!...)
A situação ficou de imediato; bem confusa, com o Sr. Alexandre a tentar acalmá-lo, e se algumas senhoras, poucas diga-se, acharam alguma graça, se assim se pode dizer ou entender, graça, a um bêbado, baixinho, e barrigudo, com botas de caubói e de fatinho, como sempre andava. Outras não acharam muita ou nenhuma graça e desataram a reclamar, alto e bom som. O dono do café, o encrenqueiro Cardoso, não sabia bem o que fazer; se por um lado acalmar e defender o cliente diário de muitas bebidas, se por outro lado tentar acalmar as chiques senhoras mais exaltadas.
Depois de muita insistência lá conseguiram afastar o “Zezé” do local, e a situação acalmou um pouco.
Era impensável conseguir realizar uma deslocação sem contar com a pronta participação do “Zezé”, e de entre varias recordo especialmente três ocasiões impossíveis de esquecer.
O Partido fez uma festa de aniversario a nível nacional em Rio Maior, e como sempre sob a minha presidência, a JSD organizou uma deslocação em força, tendo sido preparada a ida para além de vários carros particulares de 2 autocarros, portanto mais de 100 jovens se deslocaram neste evento, entre os quais o “Zezé”.
O dia foi cheio de animação, e claro também de muitas bebidas, o que para o “Zezé” era uma verdadeira gloria e benção dos céus. De tal forma o dia foi animado que depois de se poder ver o “Zezé” a dançar no meio das bailarinas das escolas de samba no meio da avenida, chegada a hora de organizar o regresso ninguém conseguia encontrar o “Zezé”.
Mais tarde conseguiu-se esclarecer a situação de modo bem rápido, assim com um atraso de cerca de 2 horas, em relação á hora combinada e prevista para dar inicio ao regresso; e com o motorista do autocarro em que faltava o “Zéze”, no limite da paciência, eis que surge o nosso herói, acompanhado por uma vistosa dama, de bem mais de quarenta anos.
Explicação simples, e visível, o nosso herói campeão, andou a correr todas as tascas e tasquinhas da feira, que estava instalada junto ao local do comício festa. Acabou por, já bem alcoolizado, fazer amizade e conquistar a referida dama, que por certo também já alcoolizada o acabou seduzir, e, por o levar a passar a tarde, com alguma animação extra á mistura, e alguma aconchego, até a sua casa, onde acabaram por adormecer, tendo mais tarde acordado e vindo trazer a sua paixão, de uma tarde, ao local de onde o tinha levado para o ninho do amor.
Numa outra deslocação a Évora, num intercambio combinado com a Distrital e Concelhia de Évora, á época liderada pelo meu amigo Antonio Balão e a sua então esposa, Maria do Céu Ramos. Iniciativa que incluía um jogo de futebol de 11, durante o período da manhã, e almoço, com a tarde livre para passear pela cidade, o nosso amigo “Zéze” mal chegado á cidade, logo descobriu que o bar do Estádio do Lusitano de Évora tinha wisqui a preços quase simbólicos. Assim desde logo se dedicou a levar a cabo um verdadeiro vendaval, tentando esgotar todas as garrafas visíveis na prateleira, emborcando cálices do precioso néctar sem parar.
Já o jogo de futebol se encontrava na 2ª parte, quando ele conseguiu chegar junto da assistência, obviamente já devidamente acompanhado, por uma carraspana muito jeitosa, e também por um grupo de alentejanos que aderiram ao seu clube alcoólico, desde a primeira hora, pois por certo já eram sócios de mérito da cooperativa local de alcoólicos e afins.
Claro que como já estava na fase da animação, decidiu que se iria sentar junto do relvado, no banco de suplentes da nossa equipa, fazendo de treinador, o que constituiu uma animação extra para todos os presentes, graças ás suas ordens técnicas e táticas lançadas em altos berros para dentro do relvado.
Recordo que a animação foi tanta que as jovens alentejanas, deliravam com as suas graçolas e imensas frases de inegável paixão á primeira vista, para com damas tão gentis e belas.
Logo que lhe foi possível, aproveitou para fazer amizade mais especial com um alentejano da JSD de Évora, que também adotou o “Zezé” como sua mascote, e lhe apresentou tudo quanto era mulher. E assim se tornaram amigos inseparáveis, até á hora das despedidas para regressar ao Barreiro.
Assim chegados, á hora do almoço, e perante um salão bem repleto de militantes, e após eu e o Antonio Balão termos usado da palavra; para saudar os presentes e a iniciativa, e ainda mesmo antes de se iniciar o almoço, já o “Zezé” tinha conseguido comer de imediato o seu bife e atacar o prato do saudoso Carlos Couto, retirando de lá o bife, deixando apenas o acompanhamento.
Foi uma cena e tanto quando o Carlos Couto regressou do WC e viu o seu prato só com o acompanhamento e sem o bife. Iniciou-se uma larga discussão com os empregados do restaurante, afirmando que não tinha sido servido, e que para ele apenas tinham deixado o acompanhamento da refeição. O Carlos nem se dava conta de que ao seu lado o “Zezé”, já ia lançado a atacar o segundo bife, e ainda por cima era mesmo o seu, dando-se ainda ao luxo de solicitar aos empregados, mais batatas, arroz e até um ou dois ovos estrelados, que segundo ele; iriam muito bem com os bifes, e claro tudo regado com um bom vinho da região.
A situação do almoço do Carlos acabou por ficar resolvida por mim e pelo “To Balão” sem problemas de maior, e o “Zezé” que aparentemente tinha recuperado da primeira bebedeira do dia, acabou a refeição já numa fase muito adiantada da segunda bebedeira do mesmo dia.
Durante a tarde todo o mundo andou a conviver em Évora, enquanto eu tive uma reunião de trabalho com a Concelhia e a Distrital local. Entretanto soube, mais tarde, que o amigo alentejano andou a mostrar Évora e os seus monumentos, tanto arquitetônicos, como de carne e osso, e em especial as suas muitas tascas e tasquinhas ao “Zezé”, pelo que o seu estado era novamente lastimoso.
Quando eu fui com o Antonio Balão e outros membros de Évora e do Barreiro, a um centro comercial para lanchar, encontramos o “Zezé”, com o seu inseparável amigo alentejano, na entrada do local. Ele mal nos viu fez desde logo uma imensa festa, o que era sempre muito mau prenuncio, ainda mais que aproveitou a ocasião para solicitar a informação sobre a proximidade de um WC, ao que lhe informaram que no centro comercial havia um, era só uma questão de perguntar a um dos funcionários ou numa loja, que alguém informava a localização.
Recordo que, fomos lanchar no 1º piso e que o centro comercial tinha um jardim interior no r/ch, com alguns espelhos que refletiam um pouco do que se passava em vários ângulos.
Qual não foi o nosso espanto, quando passado algum tempo nos foi dado ver refletido em um dos espelhos o “Zezé”, a urinar do 1º piso para o pequeno jardim térreo, uma cena verdadeiramente hilariante porquanto algumas pessoas que estavam no r/ch, olhavam para cima para conseguirem ver de onde vinha aquela autentica fonte, repuxo.
Não tenho palavras para descrever o misto de riso e seriedade nos nossos rostos, perante situação tão insólita. O To Balão só me dizia que o Zezé era realmente um caso extraordinário de vitalidade e de inovação em termos de militância política...
Na hora da partida, ao fim da tarde, já ele se encontrava dentro da viatura do Licinio, quando o questionei; sobre o acontecimento do centro comercial, ao que muito simplesmente me respondeu que; Évora era muito grande e desde que acabara o almoço e tinha saído do restaurante que pedia um local para urinar, mas que o alentejano o tinha feito andar quilômetros e de um local decente para se poder urinar nada. Afirmava ainda que tinha encontrado as ruas sempre cheias de gente, e no centro comercial também ninguém lhe dava a informação sobre o WC, e depois já não dava para agüentar mais, foi melhor urinar para o jardim, que era natureza, do que contra uma parede, algo morto e imóvel...
Nem tenho também capacidade para agora conseguir descrever o que me passou pela cabeça naquele momento, mas recordo que me contive até ao extremo para não cometer alguma loucura!
Acabou por regressar ao Barreiro com a janela do carro aberta, apanhando todo o ar possível e imagino que obrigou obviamente todos os ocupantes do carro a também terem que refrescar a memória com a frescura do vento que entrava na viatura.
Chegados ao Barreiro, tudo levava a crer que; o dia teria terminado em termos de animação, por parte do nosso amigo “Zezé”. Desta forma todo o grupo decidiu ir jantar a um restaurante que ficava situado na Rua Vasco da Gama, quase ao lado do edifício do antigo Centro de Emprego, e por incrível que possa parecer ele acabou por conseguir apanhar ali a sua terceira bebedeira do dia. Encerrou a longa jornada desse dia na Boleira do Parque na maior animação possível, com as habituais cenas hilariantes de comedia musical, que é bom nem descrever, tal a situação publicamente criada, e que só a incansável paciência do meu grande amigo senhor Alexandre conseguia agüentar.
No decorrer do VIII Congresso Nacional da JSD, realizado em Troia, criei um intercambio com o então Presidente da Distrital de Santarém da JSD, Miguel Relvas, que era também membro da Nacional da JSD, presidida pelo Carlos Coelho. Assim conjuntamente com o Presidente de Vila Nova da Barquinha, ficou previamente combinada uma ida ao seu Concelho, para se realizar um jogo de futebol, seguido de almoço e convívio entre as duas estruturas de militantes Concelhias.
Depois de tudo organizado, para ter lugar num Sábado, o numeroso grupo partiu dividido em 6 viaturas. O jogo de futebol estava inicialmente marcado para as 10 horas, só que a viagem correu tão bem que mal se chegou á Moita do Ribatejo um dos carros começou a fumegar de tal forma que mais parecia um comboio a vapor. Depois de se requerer a presença de um mecânico, constatou-se que o radiador tinha encomendado a arma ao criador, e de 6 viaturas passou-se a um total de 5, passando o pessoal a ficar bem apertado, graças a nova distribuição.
Como esse dia prometia desde o seu inicio grandes aventuras, chegados muito próximo da região da Chamusca, mais um dos carros resolveu encomendar a alma ao criador, e ficou mesmo por ali abandonado, junto do portão de uma quinta. Desta feita com o motor gripado em virtude da sua junta da cabeça ter queimado, e o condutor ter observado a temperatura a subir e não ter parado a tempo e horas para salvar o que ainda restava da máquina.
O resultado foi voltar a dividir os cerca de 20 elementos pelos 4 carros restantes, escusado será dizer que o pessoal ia quase ao colo uns dos outros, e desde logo ficou combinado que; alguns teriam que fazer o regresso ao Barreiro em transporte público, por ser humanamente impossível resolver a situação com o numero de viaturas disponíveis.
Acabamos por conseguir chegar a Vila Nova da Barquinha, sãos e salvos, e muito próximos das; 13 horas. Desta forma o famoso jogo agendado para a manhã, acabou por ser alterado para depois do almoço, que já estava programado e naquele momento também já atrasado.
Assim, e como forma de, bom convívio, resolveram ofertar alguns digestivos antes da refeição, e tal como seria de esperar o “Zezé” não se fez rogado, provando duas ou três rodadas bem completas de todas as especialidades, e claro que a restante comitiva também não se fez rogada na degustação dos vinhos e moscatéis da região.
Durante o almoço, e por iniciativa inicial do “Zezé”, que abriu pessoalmente as hostilidades, realizou-se uma imensa batalha com azeitonas a voar de mesa em mesa. As azeitonas tinham sido colocadas em travessas espalhadas nas mesas em quantidades industriais.
Não sei até hoje o valor real dos prejuízos causados. No entanto, tanto as toalhas como em especial os reposteiros das janelas, que eram de cor creme viraram para tonalidades entre o esverdeado e a negritude, devido aos tiros com as azeitonas, entre os elementos de Vila Nova da Barquinha e os do Barreiro, foi uma festa imensa. Quando eu entrei na sala do restaurante com o Presidente da Câmara local e o meu homologo local, aquilo mais parecia uma arena. Apesar dos apelos a festa não terminou por ai, e nesse dia nem o Presidente da Câmara local escapou aos ataques, sempre com um sorriso algo amarelo estampado no rosto, devido á caricata situação, mas acabou por almoçar e fazer todas as honras da casa como bom anfitrião.
Seguidamente o grupo dirigiu-se a pé até á escola onde se iria realizar o jogo de futebol, e no caminho até tiveram tempo para tirar algumas fotos, para recordar o evento para a posteridade.
Eu até hoje guardo uma histórica foto, de todo o grupo, em que está também presente o simpático Presidente da Câmara Municipal de Vila Nova da Barquinha. Esta foto tem como particularidade; ter sido tirada junto de um monumento local, tipo pelourinho, com uma escadaria em pedra, e em que é bem visível o espírito de grupo que norteava toda aquela equipa. Chegando ao ponto de um dos elementos, o conhecido “Peitinhos”, se encontrar com a ‘berguilha’ das calças aberta, simulando que vai urinar sobre a cabeça do Presidente da Câmara, que se encontrava logo abaixo de si.
Como se pode adivinhar, muito embora tenham insistido muito em ver as fotos, eu jamais enviei essa para o ilustre Presidente, que não deveria ficar muito satisfeito ao se ver retratado com alguém a simular uma “mijadela” em cima de si, e um outro a colocar-lhe um para de “chifres”.
Mas se eu imaginava que os acontecimentos fora da normalidade já tinham terminado, estava profundamente enganado, pois o pior ainda estava por vir a acontecer, pois resolveram, mesmo debaixo daquele estado geral de euforia alcoólica, ir participar efetivamente no jogo de futebol.
Claro que acabaram por jogar, mas ninguém me pergunte qual foi o resultado final do encontro, pois não recordo. Estive todo o tempo ocupado tentando resolver outras situações, por isso recordo sim que tive que andar a apaziguar os ânimos de muita gente, pois as namoradas dos jogadores do Ribatejo resolveram ir assistir ao jogo, e com ‘piropos’ daqui, ‘piropos’ dali, tudo acabou por descambar quase numa batalha campal, dentro e fora do campo de jogo.
Recordo ainda que o “Zezé” era na bancada uma atração á parte, devido ao seu entusiasmo no meio da confusão, gritando maravilhas sem fim para as jovens de Vila Nova da Barquinha, como, por exemplo, que; “eram boas como o milho”. Piropos que caiam bem nas adeptas femininas que sorriam sem parar, mas que deixaram os Ribatejanos ainda mais furiosos.
Face a este clima fora do campo de jogo, a temperatura aqueceu também dentro do campo, o desafio estava bem duro. Alguns dos nossos garbosos atletas até resolveram, para animar a assistência, baixar os calções mostrando o rabo, e quando desafiados pelas jovens do Ribatejo, uma vez por outra, a mostrar coisas menos decentes, para se mostrarem em publico. Em clara resposta a alguma atrevida que gritasse pessoalmente algo de importante para a mentalidade do atleta, ou ainda que clamassem alto e bom som; despe... despe..., bonzão despe se és homem...
Foi um dia para comemorar o hino á autentica luxuria. Eu enquanto Presidente da JSD, e face aos acontecimentos ocorridos nesse histórico dia; jamais voltei a; permitir a realização de jogos de futebol depois de almoços ou jantares que fossem regados a álcool.
Como podem também imaginar, a segunda parte deste intercambio também jamais se realizou. Até hoje a JSD de Vila Nova da Barquinha, ainda não retribuiu a visita ao Barreiro, pelas razões que obviamente se podem compreender, e muito em especial porque os namorados ciumentos não queriam deslocar-se acompanhados, com receio de que os ares do Barreiro pudessem contaminar e ornamentar as suas testas.
Mas nem só de acontecimentos via JSD era feita a vida do “Zéze”. Ele aproveitava a sede da JSD e do Partido, como seu ponto de encontro, para dali sair para conquistar o seu mundo, com aventuras incríveis, como as suas viagens ao famoso “Night an Day” situado em Lisboa numa das transversais da Rua Conde Redondo, onde se apaixonou perdidamente por uma das prostitutas de serviço na casa.
Durante um largo período o “Zezé”, só conhecia um caminho; era Lisboa, e o conhecido bar de alterne. Muitas vezes, eu diria mesmo que demasiadas vezes, ou sistematicamente, ele apenas queria ir ao local para ver aquela sua perola. Uma dama já bem entrada na idade, que se conseguia transfigurar muito bem, debaixo de pinturas bem trabalhadas e por certo uma cinta bem vestida para conseguir moldar os seus quadris nas medidas certas que já á muito tinham passado naturalmente pelo seu corpo.
Mas o local era também a perdição de alguns dos seus companheiros de aventura, assim o Manuel Correia, filho do saudoso Enfermeiro Correia, apenas se deslocava para fazer companhia, uma vez que não arranjou por ali nenhuma paixão. Já o Carlos “Téte” também conseguiu encontrar por ali uma paixão e até o milagre, que se tornou anedota hilariante, de conhecer uma prostituta que se dizia virgem, que lhe afirmou ter sido ele o primeiro homem da sua vida. Ela conseguiu inclusivamente explicar ainda ao inocente “Téte” que só não tinha sangrado na primeira noite em que se encontraram mais intimamente porque o pênis dele era muito delicado...
Claro que o Carlos passou a fazer parte do anedotário geral e motivo de larga risota por parte dos militantes da JSD. Havia até quem perante as suas viagens a Lisboa referisse com ironia; “O Tete vai ao santuário do Conde Redondo visitar a Virgem Maria!..., quem sabe se ainda não vai virar um S. José!”
Já o Paulo Jorge, mais conhecido por “Paulo Grande”, conseguiu encontrar a mulher da sua vida sexual, também por ali. Imagine-se conseguia sair numa única e mesma noite, três vezes seguidas com a mesma prostituta, só para ter o prazer de ir com ela para o quarto, porque segundo ele dizia nunca tinha encontrado uma mulher assim tão deslumbrante, nas artes do sexo.
Já ela não podia dizer o mesmo, e acabou por se queixar de que iria passar a esconder-se, pois era terrível ter relações com o “Paulo Grande”. Segundo ela referia o seu órgão genital era realmente muito grande, provocando-lhe dores horríveis durante a penetração, e que chegava ao ponto de lhe tocar nos ovários... Devia ter razão, pois o seu nome tinha nascido por causa dessa mesma situação ser amiudadas vezes referida. Muito embora o Paulo tenha uma estatura elevada, as namoradas comentavam muito essa particularidade e daí o “Grande”, e por outro lado uma vez uma jovem curiosa tudo fez para testar essa situação, e segundo contavam as amigas; nunca mais se iria esquecer, pois teve que recorrer aos serviços da urgência do Hospital do Barreiro para ser cozida num determinado local, mais apropriado para outras situações ou outros tamanhos menos generosos, mas claro que gostos não se discutem.
Mas o Paulo ainda me veio a ser útil, uns meses mais tarde, quando consegui deixar-lhe de herança uma namorada relâmpago arranjada na Moita, e que já se estava a tornar incomoda. Assim devido ás inúmeras visitas do “Zezé” á discoteca “Naufrágio”, eu ganhei esse premio. Foi também ali que o “Zezé” descobriu uma, outra, paixão da sua vida, onde costumava ir comigo, com o “Téte”, Paulo Grande, Tó, Antonio Melro e muitos outros companheiros e amigos da JSD.
Realmente a Discoteca Naufrágio, situada na Moita, era naqueles anos 80, algo de muito bom a nível de presenças femininas, ali passava a fina flor das mulheres da Moita e arredores, que freqüentavam constantes festas e outras animações realizadas naquela discoteca. Nós passamos a ter cartão de ingresso VIP, e a não falhar quase a nenhum importante acontecimento, passando no local alguns bons momentos.
O “Zezé” acabou por também desenvolver por ali uma paixão, desta feita com a empregada do vestiário de entrada, e quase não entrava na discoteca, pois assim que chegava ficava ali mesmo encostado no namorico platônico. No entanto, como normalmente já vinha um pouco alcoolizado procurava conter-se e então como forma de poupar dinheiro e não piorar a sua situação, de meio sóbrio, ia bebendo copos de água com pedras de gelo, imitando que estava a beber Gin Tonico. Pois por vezes até uma rodela de limão colocavam para satisfazer o seu pedido.
Lamentavelmente mais tarde voltava tudo ao normal, e o “Zezé” acabava por apanhar a sua habitual bebedeira diária.
O Carlos Eduardo “Téte”, era importante nas nossas deslocações por varias razões; para além da sua mais que divertida presença como ‘gago’, ainda levava o seu espaçoso automóvel, que funcionava como um apartamento para solucionar alguma urgência do momento.
Dizer que o “Téte” ficou batizado com aquele nome, devido à sua gagues constante, e que numa das nossas idas a Lisboa provocou a risota geral. Ao abastecer o carro de combustível, o pessoal questionou quanto devia colocar ou se devia atestar o tanque, ao que ele respondeu:
“Pra ates... atestr é té... te... e meia”
A partir desse dia ficou batizado como “Téte”!
Um dos fatos mais curiosos e interessantes destas nossas deslocações á Moita, á discoteca Naufrágio, era que tanto eu como o Tó estávamos a poucos dias de nos casar, e portanto aquilo era para nós como que uma despedida de solteiro continuada. O “Téte” por seu lado já namorava a sua atual esposa, e para todos os efeitos éramos todos bons rapazes e sem compromisso. Foi assim que por ali se arranjaram umas namoradas?! do tipo relâmpago; bem interessantes para ocupar algum tempo livre, por outro lado o Tó que nessa época dava aulas em Palmela, tinha a sua situação ainda mais complicada, pois também tinha arranjado por ali uma namorada extra?! e o fato de dar aulas se por um lado justificava a escapada noturna, por outro complicava a sua mobilidade. Foi jogando em três tabuleiros ao mesmo tempo, até mesmo á véspera do dia do seu casamento com a Paula, farmacêutica, e sua atual esposa. Nessa noite conseguiu estar com a namorada de Palmela para se despedir e acabar com a situação, e fazer o mesmo com a outra da Moita, o pior é que mesmo colocadas perante a situação, nem uma nem outra queriam terminar o relacionamento, aceitando mesmo o fato de ele se ir casar, e, portanto; deixar de ser um homem livre, mas elas mesmo assim o queriam continuar a ter disponível.
O “Téte” também por ali arranjou uma vistosa namorada?! Para animar algumas noites da semana, e eu conheci uma bancaria do Fonsecas e Burnnay da Rua do Ouro em Lisboa, que morava com a mãe, numa das ruas principais da Moita, não muito longe da Discoteca, com quem também passei alguns bons momentos, durante alguns dias da semana. Para todos os efeitos eu também não tinha compromisso algum, e claro que quando ia a Lisboa acompanhado, evitava sempre passar na Rua do Ouro.
Tudo se complicou quando ela descobriu que eu era Presidente da JSD do Barreiro, ao ver uma foto minha num jornal. A situação ainda se agravou mais quando uma tarde decidiu aparecer na sede, pouco antes de uma reunião da Comissão Política em que a Fernanda iria estar presente.
Nesse dia o saudoso Carlos Couto, como que segurou as pontas, pois eu tive que a afastar dali imediatamente, chegando atrasado á reunião, com a desculpa de ter ido tratar do local de uma festa para a JSD.
Como o perigo de ser descoberto aumentava a cada dia que passava, inclusivamente ela já falava em eu ir conhecer a sua mãe, e claro que o passo seguinte seria por certo algum compromisso mais serio, eu resolvi colocar um ponto final na situação. Na realidade com muita pena minha, pois; em termos de entendimento a nível sexual era uma verdadeira bomba. E foi mesmo graças ao generoso automóvel do “Téte”, que eu tive a minha melhor relação sexual dentro de um automóvel e precisamente com essa mulher. Nunca me irei esquecer da bucólica noite chuvosa em que; no parque de estacionamento da discoteca Naufrágio na Moita, de frente para o rio, foi consolidado esse raro e antológico momento. O mais irônico da situação foi que com toda a precipitação do momento, e com a intenção do regresso rápido á discoteca, ela acabou por esquecer, ou perder, as calcinhas no interior do automóvel. Este fato veio mais tarde a provocar hilariantes brincadeiras dos meus amigos para comigo, e ao mesmo tempo também sérios problemas para o “Téte” uma vez que foi a sua namorada a encontrar as calcinhas azuis e arrendadas, esquecidas no interior da viatura, por debaixo de um banco.
Nessa altura o “Téte” tinha entre outros problemas uma outra namorada extra, que lhe decorava o carro com baton e lhe deixava flores no pára-brisas, o que provocava a ira da namorada e cenas de ciúmes incríveis, para todos os efeitos, para a sua namorada, essas calcinhas eram resultado de uma escapada do Téte.
Eu sei bem o que isso pode provocar pois alguns anos mais tarde veio a acontecer-me o mesmo, com a famosa Ana de Sousa Leal, o que levou inclusivamente a uma viagem pela Europa para tentar resolver a situação.
Não que tenham ficado calcinhas na minha viatura, mas ela dedicava-se a escrever poemas com baton no para-brisa da minha carrinha Citroen, e de manhã era um tormento.
Por isso as calcinhas só vieram naquele momento agravar ainda um pouco a já de si difícil situação do Téte..
Sempre que me é permitido, revisito os locais adormecidos no espaço do tempo, e tal como o pensador e escritor Carlos Aranha, também eu faço como minhas as suas sabias palavras quando afirmo e reafirmo que amo voltar a estar alguns segundos que seja nos paraísos perdidos da minha infância e juventude.
Comigo seguem tão somente o peso dos sentimentos e dos gostos absorvidos, mas tenho que reconhecer que quem consegue praticar a nobre arte da leitura da memória, corre grandes e sérios riscos, pois conseguir lembrar coisas que a outros já esqueceu não é normal e como que se transformam fatos passados em autenticas lendas do presente.
Os fatos das nossas vida, ganham... ou perdem... sentido pratico quando afetam diretamente a nossa interioridade.
Nem sempre os que mais perto estão de nós entendem as razões e as intensidades das nossas experiências muito pessoais.
Todo o relacionamento significativo acaba por deixar marcas profundas no nosso intimo.
É exatamente na solidão do nosso barco da vida; muitas vezes quase á deriva, na sensação de que tudo pode estar perdido que acabamos por encontrar a nossa própria força para sobreviver ás tormentas da vida, aos desafios do nosso dia-a-dia da vida, e acabamos por entender a importância de ter amigos para nos ajudarem a combater os acontecimentos que nos tornam mais vulneráveis, quando os enfrentamos sozinhos.
Temos que ter sempre bem presente que nenhuma dificuldade dura para sempre, toda a tempestade é seguida por uma bonança e todo o problema tem sempre uma solução, por isso a importância dos amigos, sobretudo dos amigos verdadeiros para nos ajudarem a ter uma vida mais intensa e consequentemente realizada.
Na política, no seio da política pura e dura, nós não temos amigos, aqueles amigos verdadeiros, só temos muitos conhecidos amigos, que se movimentam de acordo com as circunstancias do momento e com as prováveis condicionantes do futuro.
Os verdadeiros amigos estão á margem do seio da política. Podem até viver ao nosso lado o dia-a-dia da política, mas é fora dela que podemos constatar quem são realmente esses amigos, verdadeiros e leais.
Ninguém no inicio da vida política consegue intuir isso, só quando já navega no alto mar da política se dá conta de que pensa estar acompanhado quando está; no entanto, só, sozinho, completamente sozinho no meio do mar e das tempestades da política.
Da vida política quando vamos fazer o balanço final, ficam realmente aqueles amigos que já não estão mais na política, aqueles para quem nós já só somos também amigos e não números, é isso a política: simplesmente números. A política dos pequenos valores que flutuam de acordo com a bolsa de interesses. Deste pesar da realidade resulta diretamente que as recordações são mais do que isso em termos de passado vivido, são sem qualquer duvida as lendas do presente que cada um de nós esta a viver no preciso momento em que ‘rebobina’ e torna a ver o intenso filme da sua vida.
Quem naquela época também estava a viver uma situação pessoal deveras incomoda era o Paulo “Grande”, que devido ás constantes noitadas não conseguia dar boa conta do recado no dia seguinte ao serviço dos Telefones de Lisboa e Porto.
Devo, no entanto, referir que as suas noitadas até que me foram úteis, pois como a ex-namorada da Moita não desgrudava, ele sem se aperceber, e como bom samaritano, tomou conta da situação. No entanto o problema era bem maior do que eu imaginara inicialmente, ela continuava vidrada e durante algum tempo mantinha-se numa postura de insinuação e até continuava a surgir na sede nas horas bem mais incomodas.
Depois de muitas negativas lá acabou por aceitar que a situação era impossível de reverter, e lá acabou por aceitar também os presentes que o Paulo lhe oferecia, sim ele quando queria transformava-se num conquistador muito romântico, e desde flores a fios e relógios ele tudo oferecia na tentativa de conquistar aquele coração de pedra, vidrado na pessoa errada.
Devido á conquista que tardava em se concretizar, chegou a andar algum tempo ainda mais desnorteado do que o normal, bebida cerveja como quem bebe água e numa dessas ocasiões até se acabou por expor a uma situação do mais ridículo possível, perante todo o grupo.
Era tradição no período do verão realizar ocasionais reuniões noturnas de amigos, junto da antiga igreja o Lavradio, no cimo da Avenida Joaquim José Fernandes. Ali se juntavam os amigos do Lavradio para cavaquear até altas horas da madrugada, e claro ir bebendo umas cervejas que cada um ia trazendo de sua própria casa ou comprava no café da esquina.
Numa dessas noites, e já a madrugada ia avançada, eis que surge o Paulo, já com uma boa quantidade de álcool no corpo. Nessa noite o pessoal tinha colocado uma grade de cervejas dentro do lago ali existente para conseguir manter de alguma forma a frescura nas garrafas, só que aquela tardia hora da noite já nada restava, era mesmo só a grade com garrafas vazias.
No entanto o Paulo insistia que queria uma, apenas uma cervejinha para terminar a noite, o Manuel Correia resolveu então remediar a situação, e como morava muito próximo, desde logo se prontificou para ir buscar uma cerveja fresca a casa e de caminho guardar a grade de garrafas vazias na sua garagem.
Alguns minutos depois surgiu com uma cerveja na mão, e o Paulo todo contente da vida lá foi beber. Acabou por reclamar um pouco por causa da temperatura e sobre o sabor que segundo ele a tornava acida, mas lá foi bebendo.
O Manuel Correia não parava de rir e animar o pessoal com piadas sobre a cerveja. No entanto ninguém conseguia entender a fundamentação que nos queria transmitir.
Entretanto o grupo foi dispersando e recolhendo a casa, tendo o Paulo acabado por também seguir o seu destino. Foi então que o Manuel Correia contou aos ainda presentes que como não tinha já cerveja em casa, tinha então resolvido a questão de um modo simples e bem pratico, ou seja, urinara na garrafa e tinha recolocado a tampa direitinho, fazendo esta passar por ainda intacta.
Ria a bandeiras abertas dizendo que estava tão perfeita a cerveja que até tinha espuma.
Estava então esclarecida a continua reclamação do Paulo sobre a temperatura e o sabor acido e claro a conversa e as continuas risadas do Manuel Correia sobre a cerveja.
Foi a risota e a galhofa geral de todos os presentes, é que o Paulo para além de tudo tinha uma grande mania, afirmava-se como alguém que se dizia bem mais esperto do que todo o mundo.
Claro que no dia seguinte todo o mundo questionava o Paulo sobre a qualidade da cerveja do Manuel Correia, e que lhe tinha sido servida naquela noite. Ele só afirmava que com a sede que naquele momento sentia, pois bebia tudo o que lhe oferecessem, na verdade até foi o que aconteceu. A risota geral continuava em todo o grupo, perante a sua cara de admiração, sobre tanta risota só por causa de uma cerveja fora de horas.
Só passado algum tempo, ficou então sabedor da brincadeira, e assim durante meses não falou com o Manuel Correia, eu diria mais, não sei se até ao dia de hoje voltaram mais alguma vez a falar-se, sei que ele dizia que o ia matar, mas tal intento, que eu saiba, nunca foi tentado e muito menos concretizado.
Com o crescimento da JSD em numero de militantes, passamos a contar com novas realidades e nos pensamentos desses novos militantes. De entre essas novas realidades, e, sobretudo; em virtude da resolução do assunto dos cursos de formação da Casa dos Rapazes, acabamos por ganhar alguns novos Militantes entre os quais ainda recordo a Anabela, a Paula, Isabel, Rogério, o saudoso Coreolano e o Paulo Margalhau, este o mais ativo e animador da tertúlia, entre todos.
O mais ativo e também aquele que tornou a JSD mais ecológica, é que segundo ele gostava de afirmar; gostava tanto de animais que até tinha um crocodilo em casa, numa banheira num dos WC.
Era sempre uma grande animação, escutar as suas historias sobre o tão famoso crocodilo, até ao dia em que alguém fez a proposta de ver o tão famoso crocodilo, e claro que ai a historia terminou.
De entre as muitas revelações e aventuras do Paulo, recordo o dia em que escutou o Francisco Mendes Costa, então Presidente da Comissão Política do Partido, comentar comigo que para levar a efeito a minha idéia de mudança de imagem e modernidade da sede, era necessário começar-se por substituir o teto falso do salão da sede. Para esta ganhar um novo aspecto, ficar mais atraente e agradável para os Militantes. Mas para que tal se tornasse realidade, entre outras condições, era necessário retirar o teto que lá se encontrava de gesso e ‘esferovite’, e bastante amarelecido pela antiguidade.
A sua grande entrega ao Partido e á JSD não tinha limites, e assim imaginou que seria de grande utilidade fazer, de modo voluntário e quanto antes a retirada do teto falso velho.
Assim um dia munido da chave da sede, que solicitou emprestada ao Carlos Couto, então responsável pelo bar, com a desculpa de que tinha ficado encarregado daquela importante missão, procedeu á destruição de todo o teto falso, que ficou a encher de entulho todo o chão do salão.
Ele, no entanto, tinha-se esquecido de alguns dados importantes que foram; perguntar se o novo teto já tinha sido encomendado ou mesmo escolhido e negociado, e também se estava programada alguma reunião e se era realmente útil efetuar aquele trabalho naquele momento, pois com o chão cheio de entulho era difícil, para não dizer impossível, realizar alguma ação no local, quanto muito utilizar a própria sede.
Um dos problemas é que estava mesmo programada uma Assembléia Concelhia para o dia seguinte no local, e o Mendes Costa ainda não tinha sequer imaginado a quem recorrer para efetuar o orçamento do novo teto. Assim quando chegou á sede e deparou com aquele espetáculo ia morrendo de comoção. Foi então o caos e o desespero pessoal do Mendes Costa que quando soube o autor da obra, ainda ficou mais possesso, com tamanha irresponsabilidade.
Depois ao falar com o Paulo Margalhau obteve uma resposta bastante convincente e adequada á respectiva situação:
“... Sr Costa! Eu pensava que estava a prestar um grande e relevante serviço ao Partido! Eu pensava que estava poupando trabalho e tempo na retirada do teto falso velho!...”
O Mendes Costa ficou sem palavras para contrapor, perante tanta militância ativa e altruísta, mas furioso, mais furioso do que um ‘urso’. O Paulo esteve ausente uns dias da sede, por nosso conselho e até a situação acalmar um pouco... pois ninguém sabia muito bem qual poderia ser a reação do Mendes Costa.
A sede acabou também por ficar; sem teto falso alguns meses, tendo sido a Comissão Política posterior, e da qual eu fiz parte, como Vice-Presidente, quem acabou por colocar um novo teto falso e também uma nova iluminação interior na sede.
O Paulo sempre foi, diga-se, um Militante muito prestável e ativo, sendo da sua autoria mais uma boa mão cheia de importantes realizações em beneficio direto do Partido?!
Comparável ao Paulo Margalhau, em termos de entrega e dedicação, porque não dizer mesmo sacrifício ao partido. Naquela época, só mesmo o Fernando “maluco” que conseguia arranjar confusões cada vez que surgia, e todas elas sempre com finais bem imprevisíveis.
Recordo uma noite de caravana automóvel de fim de campanha eleitoral, em que; ao passarmos junto da sede do Partido Comunista Português no Barreiro, ali bem junto do campo de futebol do Luso, o Fernando seguia pendurado na janela de um dos carros, e com uma verdadeira multidão na rua, conseguiu vislumbrar um jovem, que segundo ele, ameaçava atirar uma pedra á caravana automóvel.
O Fernando não foi de modas, conseguiu saltar do carro em andamento, e mesmo defronte da sede do PCP, agarrou o jovem e pura e simplesmente esborrachou-lhe o nariz contra o poste de iluminação mais próximo.
Foi o tumulto geral, por um lado os Comunistas presentes viam o jovem a sangrar abundantemente á sua frente e tinham o Fernando ali bem á sua mão, para poderem fazer justiça, por outro lado a caravana automóvel ali parada a aguardar o que iria acontecer, e todo o mundo a sentir no ar a fúria dos presentes a instalar-se.
Finalmente ele lá se resolveu a regressar ao carro de onde tinha saltado, mas para tal ficou de revolver na mão. Uma pistola que ninguém sabia de onde tinha surgido, e muito menos que ele possuía. Foram então momentos de grande tensão que obrigaram a negociações rápidas, com alguns membros conhecidos da JCP e do PCP, como o “Bintoito” para se tentar sair dali com todos os carros em perfeito estado, o que não aconteceu na totalidade. Algumas viaturas ainda sofreram algumas amolgadelas na chaparia, como por exemplo o carro do filho do Fernando Cruz, com uma porta amolgada.
O Fernando “maluco” era um daqueles elementos que eram bem dispensáveis nas atividades políticas tanto da JSD como do Partido, pois sempre que surgia, logo tinham lugar alguma ação extra e não programada, e quase sempre com resultados bem desagradáveis.
A época que se vivia naquele fim da década de 80, do século passado, era também um tempo de contabilização dos conhecimentos do passado, com vista a conseguir-se ter uma noção do que poderia vir de certa forma a encontrar-se no futuro.
Não posso também esquecer outro elemento bem altruísta, o Guinot que era tido como ex-legionário e pessoa da máxima confiança do Mendes Costa. Com uma compleição física enorme, andava sempre armado, o que se por um lado se traduzia em alguma confiança com a sua presença, por outro era sempre um risco, pensar-se que em algum momento pudesse fazer uso do armamento numa situação não aconselhada.
Eu aproveitava essa segurança extrema, para em período de campanha eleitoral ir para zonas quase proibidas, e com muito mais confiança. Recordo noites e noites de colocação de propaganda em campanha, somente contando com a sua companhia, e em que me sentia perfeitamente seguro. Tornou-se um meu verdadeiro guarda-costas, que muitas vezes me seguia fielmente, para todo o lado, que nem um fiel “cão” de guarda.
Muitas vezes se tornava incomoda a sua excessiva ação de segurança, como na noite em que partiu o nariz a um jovem, junto da sede, apenas porque ele estava a mexer nuns painéis publicitários do partido que secavam no exterior. Foi incrível como conseguiu deixar o rosto de jovem a escorrer sangue, apenas com uma pancada seca com as costas de uma brocha de colocação de cola. Foi necessário muito bom senso e calma para eu e o Mendes Costa acalmarmos a família do jovem, que se mostrava deveras revoltada com a trágica iniciativa, e ainda mais que ainda por cima eram militantes do Partido.
Na verdade eu com a presença do Guinot, arriscava ir colocar propaganda totalmente só, a locais verdadeiramente de alto risco, como no Alto do Seixalinho, ou em descampados próximos a zonas industriais como na chamada curva do Abreu, onde ninguém arriscava uma visita noturna sem estar bem munido de segurança. Podem chamar irresponsabilidade da minha parte, ou pura aventura, mas na verdade eu me sentia totalmente seguro e confiante. No entanto algumas vezes ele exagerava, como por exemplo, no dia em que viajávamos no salão da 1ª classe de um barco da carreira Lisboa, Barreiro, e ele se sentiu incomodado com a presença demasiado próxima de nós de um individuo, realmente estranho. Ai ele nem pensou duas vezes, e me questionou se eu não achava que estava calor, ao que eu respondi que sim, e sem dizer uma única palavra, virou-se para mim, e tirou o casaco deixando ficar bem á vista o coldre debaixo do sovaco com o pistolão á vista. O individuo olhou para ele, levantou-se e saiu de imediato do salão. Ele virou-se para mim e disse, eu bem que tinha dito que estava calor, mas podia ficar muito mais quente por aqui, assim já vai refrescar...
Na JSD a maturidade de uns contrapunha-se com a inexperiência e ingenuidade de outros, como que construir uma escola de conhecimentos sobre as virtudes e defeitos do ser humano.
Assim, quanto mais conseguíamos encarar as dificuldades, os aborrecimentos e as próprias frustrações, como testes quase diários á nossa paciência, perseverança e mesmo fé, maiores se tornam as nossas capacidades de conhecimento e evolução interior.
Desta forma sempre que as coisas deram de algum modo errado e fomos obrigados por contingências dos acontecimentos ou do destino a mudar os nossos planos, nunca nos esquecíamos da necessária flexibilidade e constante aceitação da mudança de rumos que assim podia fazer toda a diferença entre o cumprir um objetivo ou ter que criar um projeto diferente e sempre exeqüível.
É verdade, sem duvida nenhuma, que todos os dias nós, até hoje vivenciamos inúmeras emoções, nem sempre muito boas diga-se em abono da verdade, mas que sem qualquer hipótese de duvida interferem diretamente nas nossas opiniões e mesmo na nossa qualidade de vida.
Vem tudo isto a propósito de realidades e situações que ao longo da nossa vida entendemos serem vivenciadas de uma forma, mas que quando as constatamos mais de perto, temos que refazer a nossa opinião e moldar novamente as nossas, até ai convicções sobre determinados assuntos.
Assim na minha primeira Comissão Política Concelhia, um dos membros mais ativos e competentes, era sem duvida o Paulo Afonso, “chu-chu” que enquanto responsável pela área sócio-cultural deu conta de estremo dinamismo e capacidade realizadora. Foram variados os torneios, jogos florais, intercâmbios com outros Concelhos que eu captava e ele acabava por organizar e mais um sem numero de atividades que tiveram a sua intervenção direta ou indireta.
Ao longo de toda a minha vida nunca me preocupei em saber se A, B ou C vivem a sua vida privada dentro dos padrões, que a maioria considera como normais. Mas também nunca entendi como razoável misturar relacionamentos pessoais com política ou com relacionamentos profissionais.
Por essas razões o meu namoro com a Maria do Céu terminou praticamente com a minha entrada na presidência da JSD e a Fernanda acabou por praticamente abandonar a atividade política ativa, em cargos que colidissem com atribuições e competências minhas. Assim que casamos, e mesmo antes, passou sempre a desempenhar funções que não colidissem diretamente com a minha esfera de ação direta.
Curioso que nessa mesma época eu mantive um relacionamento, bem escaldante diga-se, com uma mulher, a Madalena, que era minha colega no Ministério do Trabalho, no IEFP – Instituto de Emprego e Formação Profissional do Barreiro, no entanto a sua atividade profissional em nada confluía diretamente com a minha. E muito embora trabalhássemos na mesma Entidade; exercíamos funções bem diferenciadas e estávamos na gestão de projetos que nunca se cruzavam em termos de relacionamento profissional, e penso que só por isso mesmo o relacionamento se veio a desenvolver da forma tão intensa como acabou por ocorrer.
Entretanto na JSD fui confrontado com uma situação diversa, assim o Paulo Afonso tinha uma opção sexual diversa da chamada maioria, e assumiu essa mesma situação, tendo, no entanto, surgido na sua mente uma preocupação sobre a situação e que no seu entendimento iria claramente colocar em jogo a possível coesão da equipa. O Paulo decidiu ir viver com um companheiro em Paço de Arcos, e dessa forma abandonar a casa dos pais, bem como a região do Barreiro.
Solicitou por esses motivos falar comigo particularmente, e recordo que foi de uma humildade e frontalidade pessoal mais do que extremas.
Para mim, enquanto Presidente e para a Comissão Política, seria uma perca considerável a sua saída prematura. Posteriormente e com algum esforço em termos de capacidade de argumentação, consegui-o convencer a manter o seu lugar e a efetivar o trabalho sem necessitar de contar com a sua presença física constante.
O Paulo continuou assim a desenvolver o seu trabalho e acabou por vir a concluir o mandato.
Tomei conhecimento posterior de que passados alguns anos ele ainda mantinha a sua opção sexual diversa da chamada maioria, e esse relacionamento pessoal estável.
Nem por isso desceu na minha consideração, e se hoje o recordo é para contrapor a outro exemplo bem diferente, de alguém que muito embora com uma orientação sexual inicialmente diferente, pretendia manter uma aparência diversa da realidade.
O Dr. Joaquim Navalho, que tinha sido casado e pai de filhos, sem o assumir publicamente era, no entanto, um gay, ou quanto muito um bi-sexual. Situação que acabou por ser confirmada por mim, após me ter sido confirmada por freqüentadores assumidamente gay’s, de um local de encontros homossexuais situado na época, na zona do pinhal de Coina, muito próximo da nova estação ferroviária. Eu próprio acabei por me dar ao trabalho de passar de automóvel pelo local nos horários referenciados, e acabar por confirmar a sua presença no local. Mais interessante ainda foi o fato de que eu para não ficar com qualquer duvida, me desloquei dentro da zona de mato e pude constatar visualmente a sua intensa e diversificada atividade lúdica pessoal. Muito curioso é o fato de que ao longo da sua participação política, conseguia aparentar um posicionamento totalmente diverso, por um lado extraordinariamente pró-moralista, e por outro pró heterossexual, uma vez que conseguia interromper ostensivamente as reuniões da Comissão Política Concelhia do Partido para assistir na tv ao programa erótico semanal da Playboy.
Tanto o Partido quanto a JSD tinham no seu grupo de militantes diversos exemplos de desvio de conduta sexual da chamada opção dita como normal, no entanto ninguém conseguia assumir frontalmente a situação da sua opção pessoal como o fez de forma tão direta o Paulo Martins Afonso.
Registre-se ainda que este assunto mereceu na época, o total respeito e admiração de todos os membros da minha Comissão Política e da também da maioria dos Militantes que entretanto foram tomando conhecimento da situação, por sua livre e espontânea iniciativa pessoal em termos de divulgação.
A JSD do Barreiro segundo relatos de membros que vivenciaram as épocas em questão, já tinha tido situações anteriores análogas, sendo o caso mais obvio o do seu antigo Presidente João Azevedo, que é sem a mínima duvida um homossexual não assumido, no entanto na época da minha presidência, e por várias vezes acabou por se insinuar para comigo, tendo eu respeitosamente respondido de um modo bem delicado, fazendo que não entendia o seu tipo efeminado, a sua cara a nadar em cremes e os objetivos da abordagem.
É obvio que o pensamento é livre e um direito inalienável de cada um, numa sociedade livre, no caso concreto e particular do ex-Presidente da JSD é notório que o seu relacionamento pessoal com outras ilustres personalidades do Partido, era bem mais em termos de defesa do chamado loby gay e ao mesmo tempo de objetivos pessoais. Por exemplo; na sua aparente amizade com um ex-governante, basta observar-se um pouco o Dr. Mira Amaral, para se ter uma noção, ou mesmo uma clara convicção pessoal de se estar na presença de alguém com claros indícios de diversificação sexual. A opinião e o pensamento, mesmo em voz alta, são obviamente livres, e aquilo que hoje assumidamente aqui escrevo é a minha analise perante as vivencias observadas e a minha livre convicção pessoal.
A JSD do Barreiro foi assim; em tempos remotos composta por um núcleo de jovens, com opções sexuais diversas, o que em nada veio a dificultar o seu desempenho político social, e a formação de jovens quadros políticos, que em nada se revelaram ligados a esse famoso Loby, com ligações claras a essas gerações, mas sem o mínimo de indícios de opção pessoal diversa da chamada maioria.
A JSD tinha naquela época; a da minha presidência, um apelidado e determinado grupo de oposição. Uma força de pensamento determinante em termos de bloco unitário, e figuras como o Paulo Freitas, José Carlos Lopes, Luis Pineza, Fernando Pineza, Fernando Cruz Filho, Antonio Macedo, e o saudoso Carlos Couto entre muitos outros, que ainda hoje enquanto militantes do Partido, mantêm uma linha de pensamento bem diversa das novas gerações.
Não estou com isto a chamar de “Velhos do Restelo” a esse grupo, muito embora assim os tenha batizado em determinado momento político.
No entanto, todo o mundo, todo o ser pensante, tende a evoluir, obviamente que uns mais rapidamente do que outros. As suas perspectivas de movimentação pessoal, infelizmente, sempre se baseavam mais no pessoal do que no coletivo, o que contrapunha com o nosso entendimento político e social, entre outras opções e diferenças básicas, e daí as nossas grandes divergências políticas, que nunca pessoais, pois existia e existe ainda hoje um bom entendimento a nível pessoal.
De entre a chamada nova geração, é bom ressalvar que a gestão dos novos quadros políticos foi mais voltada para a sua formação e integração na sociedade, no entanto tenho que priorizar, alguns poucos casos, como por exemplo; o do Bruno Vitorino que entrou na JSD sob a minha presidência e aprendeu muito do que hoje sabe em virtude da sua participação em duas Comissões Políticas por mim lideradas.
A sua entrada acaba por acontecer por mero acaso e pura brincadeira, com o José Reis Marques “Zezé” a insistir na sua filiação. Diga-se até que; foi uma filiação um pouco contra a sua própria vontade pessoal inicial, uma vez que, era visível a sua maior inclinação para os Socialistas, onde a sua mãe militava, e como ele era um jovem muito agarrado ás “saias da mãe”, a sua opção naquela época era muito mais de proximidade familiar, e não tanto de ideologia política.
No entanto acabou por assinar a ficha de inscrição na JSD, que a minha Comissão Política Concelhia ratificou. Reconheço que a aprovação da sua filiação não se deu tanto em termos de convicção perante o seu ideal político e social, mas bem mais por razões familiares, uma vez que o seu pai e o irmão mais velho eram já militantes do Partido, o que nos dava algumas garantias de conhecimento mínimo sobre a integridade pessoal do individuo naquela época.
Era naqueles tempos um jovem bastante imberbe, introvertido, e pouco dinâmico e até algo trapalhão nas abordagens, durante os primeiros tempos de militância. A sua personalidade á data, nada tinha que ver com a desenvoltura demonstrada pelo seu irmão na área política e social, onde; inclusivamente chegou a ser Presidente da Associação de Estudantes da Escola de Santo André.
A pouco e pouco, no entanto, foi-se integrando no espírito de grupo da JSD e no ano seguinte eu resolvi dar-lhe uma oportunidade e dessa forma convidei-o para integrar a minha equipa da Comissão Política Concelhia, como vogal para a área sócio-estudantil, ficando debaixo da coordenação direta do David Figueiredo, e do João Ilídio Barbosa. Começou então a desenvolver-se, e graças a esses dois ótimos quadros políticos juvenis, foi capaz de realmente aprender de forma rápida os meandros mais básicos da política. No entanto os seus resultados ao nível de realizações, nas associações pelas quais ficou responsável, nesse primeiro ano, não foram nada relevantes, com a conquista de algumas associações já esperadas e até com uma derrota algo inesperada na Escola Alfredo da Silva.
No ano seguinte; eu estava já a idealizar a minha saída da JSD para o Partido, e a procurar lançar quadros políticos, com vista ao futuro da JSD, e foi então convidado para ser um dos meus Vice-Presidentes, tendo então conseguido assimilar todo o funcionamento da maquina local da JSD.
Passado mais um ano resolvi então apostar um pouco mais e levei-o comigo para a Distrital de Setúbal da JSD, e também ai lhe dei a oportunidade de aprender o modo de funcionamento de uma estrutura Distrital.
Será lógico surgir a natural pergunta; se eu considero o Bruno Vitorino como um delfim político meu. A resposta só pode ser dupla, ou seja; por um lado sim e por outro um não.
O Sim, na medida em que lhe dei todas as aberturas e condições para poder concretizar a sua aprendizagem e crescimento concreto enquanto jovem no interior da JSD, não lhe faltando com incentivo e também com alguma moderação quando foi caso disso, e não foram poucas as vezes em que isso teve mesmo que acontecer.
O Não, no justo sentido em que muito embora lhe tenha facultado o aprendizado, inclusivamente de muitos dos jogos de bastidores da política, não posso, de forma algum ser responsabilizado por alguns atos e procedimentos mais recentes. Falo de atos e procedimentos pessoais com que tem pautado a sua vida em termos de atuação ativa na política, nomeadamente nas chamadas traições políticas e outros jogos muitas vezes de baixo caráter pessoal que me têm vindo a relatar ao longo do tempo, e em especial muito recentemente nas lutas a nível distrital e da concelhia.
A JSD mais do que uma escola política deveria ser também uma escola a nível de índole social e hoje é com agrado que tomo conhecimento de que muitos dos que me acompanharam nas mais importantes tarefas na JSD bem como no Partido, são hoje homens e mulheres estabilizados na vida e com as suas vidas pessoais e profissionais cunhadas de êxitos, que obviamente não se podem contabilizar por uma responsabilidade a 100% pelas suas passagens na JSD ou no PPD/PSD, mas que bem lá no fundo tem uma pequena matriz de responsabilidade em alguns aprendizados recolhidos nesses importantes tempos das suas vidas e sem duvida que um Antonio Melro é hoje um bancário de gabarito, o Luis Filipe um bom responsável instrutor de condução e empresário de sucesso, o Paulo Afonso um economista com ótimas qualidades, o Álvaro Ferreira um responsável administrativo com reconhecidos méritos no setor militar, o Carlos “Téte” um empresário de sucesso na área da reparação automóvel, o Licinio Seabra um técnico de computação com muito prestigio, o Paulo Margalhau é hoje um empresário de sucesso, o Carlos Vitorino um prestigiado funcionário da Brisa e um bom Presidente da Concelhia de Palmela do PPD/PSD para além de dar cartas na área sindical, o João Ilídio um muito bom chefe de vendas, o Sidonio Sousa um excelente Chefe na CP, o Filipe Simão um ótimo gerente bancário, o Luis Eduardo um bom engenheiro que também bem poderia ter sido um ótimo advogado, pois não esqueço nunca a sua brilhante proposta de regulamento interno para a JSD da época, em que algumas das suas propostas foram contempladas na redação final, a Marilia Alfaiate hoje uma ótima enfermeira, que também poderia ter sido uma ótima engenheira química, e quem sabe se um dia não conclui o curso superior inicial, o Luis Engrossa que é um bom gestor, a Helena Rodrigues com uma carreira a nível bancário impar, iniciada em Macau e que agora não tem parado de dar cartas em Portugal, o João Palma como empresário de sucesso, o Celinio Reis outro empresário de sucesso, o Jorge Costa um policial de reconhecida craveira, o José Peleja um empresário do ramo imobiliário que não deixa os seus créditos por mãos alheias, e tantos e tantos outros que conseguiram aprofundar as suas vidas, e me deixariam aqui a descrever paginas e paginas de êxitos. Não posso esconder que também existem felizmente poucos, mas alguns fracassos, que pela sua natureza obviamente me escuso de aqui enumerar. Estou certo, no entanto, de que nunca vão poder esquecer que um dia militaram de forma efetiva na JSD e que por muito pouco que possam ter aprendido nesse seu trajeto político e pessoal, algo acabou por ficar em termos de aprendizado, especialmente na área social.
A Distrital de Setúbal da JSD é um exemplo acabado de como uma deficiente integração pode, no entanto, formar alguns deficientes quadros, sem deixar de se realçar que existem sempre exceções, e que temos de separar o trigo do joio.
Lamentavelmente a política deixou de ser uma missão para servir a “Polis” como pregava Aristóteles e tornou-se uma profissão, em que alguns mais nada sabem já fazer na vida. Um desses exemplos acabados é o do Bruno Vitorino, que fora da política mais nada sabe fazer, e habilitação ou profissão não tem.
A partir dessas situações e dessa lógica criada em torno dos profissionais da política abre-se no fundo uma crise de governança e não governabilidade, porquanto o sistema político cria ciclos de “aberrações” e dessa forma as relações entre os diversos poderes tornam-se pura improvisação da democracia, passando a existir trocas meramente comerciais entre os cargos e os poderes.
O sonho de que o desenvolvimento econômico e social levaria a uma sociedade mais justa, pacifica e igualitária, esta a dormir ou morreu, exigindo um novo sonho.
No entanto eu creio que alguns dos meus mais profundos sonhos políticos morreram mesmo, ou pelo menos estão, entretanto, dormindo!

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